Práticas de intensificação da pecuária podem aumentar lucro em até 36%

24 de maio de 2021 | Notícias

maio 24, 2021 | Notícias

Por Sara R. Leal¹

Esta é a primeira de uma série de reportagens que o IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), no âmbito do projeto CONSERV, publica para apresentar e estimular o debate sobre boas práticas no campo.

Reduzindo a pressão pela abertura de novas áreas para a produção agropecuária, a natureza mantém os serviços ecossistêmicos essenciais à agropecuária, como produção de chuva, ao mesmo tempo em que o produtor aumenta sua rentabilidade.

Há mais de 50 anos colocada em prática no Brasil, a intensificação na produção da pecuária ajuda a diminuir a pressão sobre a vegetação nativa ao elevar o rendimento em áreas já abertas.

Em estudo publicado em 2009, a Embrapa estimou que, em uma área de pasto de baixa produtividade, é possível quadruplicar o número de cabeças por hectare e ainda alocar parte significativa da área para a produção de outros alimentos, energias, reflorestamento ou preservação. Isso porque, ao manejar e intensificar a produção em pastos de baixa produtividade, consegue-se aproveitar melhor as áreas já abertas.

“Investir em tecnologia é o que chamamos de ‘ganha-ganha’, pois o produtor investe e ganha em produtividade, ou seja, o retorno é sempre positivo”, afirma o pesquisador da Embrapa Acre (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária do Acre) e presidente do Comitê Gestor do Portfólio Amazônia, Judson Valentim.

Um relatório do Instituto Internacional para Sustentabilidade (IIS) publicado em 2015 demonstra que o sistema intensivo de pecuária pode aumentar o lucro da produção na Amazônia em até R$ 1.940 por hectare. Os resultados das simulações indicam que a probabilidade de lucro aumenta em até 36% nas propriedades com 300 ha e até 19% em fazendas com 4 mil hectares.

Além disso, um estudo realizado pela TNC (The Nature Conservancy), no ano de 2017, demonstrou que o custo para abertura de novas áreas na Amazônia Legal é de R$1614 por ha, enquanto outro estudo do IPAM, feito em parceria com a UFF (Unlocking Forest Finance), também em 2017, apontou que o custo de transição entre um sistema de pecuária extensivo para um sistema um pouco mais intensificado na região seria de R$627 por ha. Os custos de manutenção são compensados pelo ganho em médio prazo, com lucro líquido entre R$99,00/ha até R$233,00/ha por ano, a depender do nível de intensificação.”

Sistema rotacionado

Existem diferentes maneiras para aumentar a produtividade da pecuária, e hoje existem no Brasil conhecimento técnico à disposição para quem deseja trilhar esse caminho.

Uma das formas é a rotação de pasto. A estratégia tem três etapas: recuperar ou renovar o pasto, melhorando a qualidade da pastagem; subdividir a área em vários pastos menores, com piquetes; e implantar áreas de lazer para o gado, com cochos para suplementação e bebedouros.

Ao alternar os animais entre esses novos espaços, o solo se recupera, o gado aproveita melhor o pasto disponível e tende a ganhar mais peso e de maneira mais rápida. Ao implementar os cochos e os bebedouros, o animal tem acesso à suplementação alimentar em períodos estratégicos, como em períodos secos, e à água de qualidade, uma vez que, ao acessar lagos e rios, os animais acabam pisoteando as margens e ingerindo água misturada com terra, urina e fezes – dessa forma, reduz-se o esforço dos animais, evitando que percam peso, ao mesmo tempo em que se protege as áreas de preservação permanente na margem dos corpos d’água (APP).

A rotação tende a aumentar significativamente a produção de carne por área, contribuindo para reduzir a idade em que o animal será abatido. Um experimento realizado em 2015 pelo Instituto Centro de Vida (ICV) em Alta Floresta, no Mato Grosso, demonstrou que, com a rotação e reforma de pastagem, aliada à suplementação alimentar, é possível triplicar e em alguns casos até quintuplicar a produtividade na mesma área.

Gado confinado

Outro método de aumentar a produtividade sem expansão de novas áreas é a implementação dos sistemas de semiconfinamento e/ou confinamento, em que o animal pode ser ficar exclusivamente no cocho, com suplementação alimentar, ou intercalando momentos no cocho e no pasto.

A técnica começou a ser mais utilizada no país no início dos anos 2000. Por demandar mais investimento e conhecimento técnico, geralmente é mais usada por médios e grandes produtores.

O retorno, em compensação, é consistente. O confinamento ou semiconfinamento faz com que o animal ganhe peso mais rápido, resultando no abate mais jovem e com melhor acabamento de gordura – elemento cada vez mais valorizado pelo mercado. No entanto, é importante respeitar a biologia dos animais: colocar sombrites para diminuir a exposição do gado ao sol e a chuvas e molhar o rebanho em períodos mais quentes, entre outras medidas. Esses cuidados aumentam a eficiência do sistema produtivo e melhoram a qualidade do produto final.

Após ouvir alguns colegas falarem sobre os benefícios do sistema de semiconfinamento, o produtor rural Redi Biesuz decidiu adotar a tecnologia em sua propriedade, em Mato Grosso. Ele, que já realiza o manejo de pasto, constatou o resultado positivo e começou a implementar a nova estratégia em sua fazenda.

Redi Biesuz é um dos contratados do projeto CONSERV, lançado em outubro de 2020 pelo IPAM, em parceria com o Woodwell Climate Research e com o EDF (Environmental Defense Fund). O mecanismo privado e de adesão voluntária remunera financeiramente produtores rurais da Amazônia Legal que se comprometem a conservar o excedente de vegetação nativa em suas propriedades que, por lei, poderia ser suprimida.

Devido à sua participação na iniciativa e por adotar boas práticas de intensificação, o produtor diz não ver necessidade em abrir novas áreas por muitos anos. “Além de melhorar o faturamento, são tecnologias que geram mais emprego na pecuária, ao contrário do sistema extensivo, que emprega pouca gente. São vários os benefícios”, completa Biesuz.

Ganha-ganha

Boas práticas de intensificação ainda podem contribuir para reduzir as emissões de gases do efeito estufa. Esse fator é fundamental para a regulação do clima e para a manutenção das chuvas, por exemplo.

Um estudo publicado pelo Imaflora (Instituto de Manejo e Certificação Florestal Agrícola) em 2016 aponta que, enquanto o sistema extensivo emite 79,4 kg de CO2e por quilograma de carne produzida;, no método intensivo esse número diminui para 32 kg de CO2e por quilograma de carne – uma redução de 60% se comparado ao sistema tradicional. O artigo também mostra uma redução de 52% de emissão de CO2e por ha ao passar do sistema extensivo para o intensivo.

Segundo Valentim, é importante lembrar que a intensificação deve caminhar paralelamente com a fiscalização efetiva. “Para um desenvolvimento equilibrado, é preciso ter os dois lados da balança: de um lado as tecnologias para intensificar a produção; do outro, a governança ambiental, de modo a controlar o desmatamento”, alerta.

Para saber mais sobre boas práticas na pecuária:

Manual de boas práticas agropecuárias em bovinos de corte – Empresa Brasileira Pesquisa Agropecuária (Embrapa)

Manual de práticas para pecuária sustentável – Grupo de Trabalho da Pecuária Sustentável (GTPS)

Programa Novo Campo – Instituto Centro de Vida (ICV)

Subsídios para uma agropecuária sustentável no Mato Grosso – Instituto Internacional para Sustentabilidade (ISS)

Financiamento de Paisagens Sustentáveis: Mato Grosso, Brasil – Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia – IPAM

Leia todas as matérias da série Garantindo o futuro na prática:

Introdução: Futuro do agronegócio passa pela valorização do solo brasileiro.

Práticas de intensificação da pecuária: sistema rotacionado de pastagens, semiconfinamento e confinamento.

Melhoramento genético do rebanho.

Intensificação do uso solo: safra e safrinha, plantio direto, intregação lavoura-pecuária e lavoura-pecuária-floresta.

Controle biológico de pragas.

Regularização ambiental e benefícios para produtor que cumpre a lei.

 

¹Jornalista e analista de Comunicação no IPAM, sara.pereira@ipam.org.br



Este projeto está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

Saiba mais em brasil.un.org/pt-br/sdgs.

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