Tão discreta quanto a beleza é a destruição do Cerrado, a grande savana brasileira.
Embora nascido em Patos de Minas, o escritor Carmo Bernardes, que morreu em 1996, considerava-se goiano. Um goiano do pé rachado, como dizia. Com sua fala simplória, o mineiro explicava a incrédulos que o Cerrado é uma floresta de cabeça para baixo, pois em muitos lugares há mais matéria vegetal subterrânea, escondida sob o solo, que exposta. Às vezes as raízes têm de mergulhar em busca da água dos lençóis profundos – mais aqui, menos ali, dependendo de a planta estar em cerradão ou mata de galeria, mata seca ou vereda, campo limpo, campo sujo ou cerrado senso estrito, as sete paisagens desse ecossistema que os cientistas enumeram. Em certos lugares, a biomassa subterrânea de uma árvore chega a ser sete vezes maior que a exposta.
Nos mais de 2 milhões de quilômetros quadrados do Cerrado, cerca de 24,1% do território brasileiro, predominam mais arbustos e ervas que árvores. Mas há também matas secas, as chamadas florestas deciduais aroeiras, perobas, ipês, cerejeiras, cedros , que perdem quase todas as folhas no inverno, uma estratégia para guardar energia e enfrentar a estiagem e o frio. Já foram identificadas mais de 12 mil plantas os pesquisadores acreditam que possam existir pelo menos 20 mil , das quais 4 mil são endêmicas. Na última década, só de flores, foram identificadas 966 novas espécies. Para ter uma idéia, o Distrito Federal, com menos de 6 mil quilômetros quadrados em meio ao bioma, tem mais orquídeas conhecidas que toda a Amazônia. Segundo o I Relatório Nacional para a Convenção sobre Diversidade Biológica, o Cerrado brasileiro guarda pelo menos um terço dos 15% a 20% dessa diversidade no planeta. Em certos pontos, chega-se a encontrar até 28 espécies por metro quadrado. Na estação seca parece uma orgia de flores miúdas, multiformes e coloridas. O povo mais antigo orgulha-se de utilizar cerca de 300 espécies na medicina popular, que os cientistas estudam para encontrar formas de uso industrializáveis.
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