Um sonho: produzir conhecimento para mudar realidades

27 de maio de 2024 | Notícias, Um Grau e Meio

maio 27, 2024 | Notícias, Um Grau e Meio

Por Sara Leal*

Em entrevista publicada na newsletter “Um Grau e Meio”, Adriana Moreira, especialista em conservação da biodiversidade, mudanças climáticas e sustentabilidade ambiental, PhD em Ecologia pela Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, fala sobre a fundação do IPAM e momentos marcantes do Instituto.

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A produção é gratuita e quinzenal, de autoria do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), com abordagem especializada e análises exclusivas sobre clima, meio ambiente e sociobiodiversidade.

IPAM: Conte-nos sobre como foi a fundação do IPAM e sua participação neste processo.

Adriana: Sempre vi a necessidade de termos instituições nacionais fortes que pudessem trabalhar com uma base científica e pesquisas que fizessem ponte com a implementação de políticas públicas. O IPAM surgiu desse sonho. Nos Estados Unidos, conheci o Foster Brown e Daniel Nepstad e, no Brasil, a Marli Mattos, Silvio Brienza, dentre outros que trabalhavam na Embrapa de Belém, além do Paulo Moutinho, Cassio Pereira, Ane Alencar e José Heder Benatti.

A partir daí, começamos a formular essa ideia de criar uma base para uma instituição na Amazônia que tivesse uma perspectiva de longo prazo da visão dos ecossistemas amazônicos. Enxergou-se uma oportunidade de não só produzir ciência de qualidade, mas fazer ponte com as necessidades da região e com as políticas públicas, com os tomadores de decisão. Em 1995 formou-se o primeiro conselho do IPAM, do qual eu fui presidente.

Foi uma construção coletiva. O IPAM é resultado de vários sonhadores que sonharam juntos e o sonho foi realizado. Tenho muito orgulho de ter contribuído para a criação de uma instituição tão sólida que colabora de forma fundamental, tanto para a pesquisa e políticas públicas brasileiras, quanto para o desenvolvimento sustentável de toda a bacia Amazônica e do Cerrado brasileiro.

Quais momentos você destacaria na história do IPAM?

Uma das histórias que representam a origem do IPAM foi nossa atuação na construção de um mineroduto no Pará, que ia de Paragominas até Barcarena. Acompanhamos a audiência pública para discutir o projeto e o relatório apresentado não considerava todos os impactos ambientais que uma grande obra de infraestrutura como essa poderia causar na região amazônica. À época, estávamos desenvolvendo projetos de pesquisa na região com o Centro de Pesquisa em Clima Woodwell, grande parceiro do IPAM, e pudemos apresentar a base científica que tínhamos e os impactos que a floresta poderia sofrer. Graças a essa atuação com base em dados, o impacto da infraestrutura foi reduzido. Isso está na origem do IPAM: influenciar políticas e planos de desenvolvimento com método e dados científicos. E foi assim que a instituição começou a ficar conhecida.

Após o IPAM chegar em Brasília, em 1995, também houve dois eventos muito importantes. Um deles foi o apoio na criação e aprovação da lei do Sistema Nacional de Unidade de Conservação das áreas protegidas, chamada “Lei do SNUC”, que tramitou no Congresso por 10 anos. Fizemos um trabalho de relação com o congresso para discutir a importância das comunidades nas áreas protegidas, pois havia um conceito de que área protegida era “área sem gente”. Apresentamos na Câmara um dos primeiros livros publicados pelo IPAM, em 1998, o “Presença humana em unidades de conservação”, que influenciou diretamente nessa legislação tão importante para a conservação e para assegurar os direitos coletivos das comunidades tradicionais ao território e à sua biodiversidade.

Outro episódio que aumentou a popularidade do IPAM no Brasil e fez com que ele aparecesse na mídia pela primeira vez foi durante o El Niño muito forte que ocorreu em 1998. Daniel, Ane Alencar, eu e outros já pesquisávamos sobre o impacto da seca e do fogo na vegetação e éramos considerados especialistas no tema. Com a intensidade do fenômeno e toda a mídia falando a respeito, nos tornamos umas das principais fontes sobre o assunto, dentro e fora do Brasil. Publicamos outro livro chamado “Floresta em Chamas” com apoio do Banco Mundial, que ainda é uma das grandes referências sobre a questão do fogo na Amazônia.

O IPAM “puxou” muitos tópicos que hoje estão bastante consolidados, mas, na época, não se tinha nada. Publicamos o primeiro livro em português sobre mudanças climáticas e os ecossistemas brasileiros com a colaboração de Steve Schwartzman, do EDF [Environmental Defense Fund], grande parceiro do início do IPAM. Trouxemos essa visão de que a ciência precisa contribuir para apoiar povos e comunidades tradicionais, além dos agricultores familiares, para um desenvolvimento inclusivo e equitativo socialmente.

O que você espera para o futuro do IPAM?

O IPAM tornou-se referência para toda a bacia amazônica e para todas as florestas tropicais como uma instituição que faz pesquisa de alta qualidade e política pública. Espero que se consolide cada vez mais como uma referência para o sul global e continue sendo esse elemento catalisador da transformação e tradução da ciência para influenciar as políticas de desenvolvimento não só a nível nacional, mas também no nível global das discussões sobre clima e biodiversidade.

*Coordenadora de comunicação do IPAM, sara.pereira@ipam.org.br
Foto de capa: Hallie Easley

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