Pelo terceiro ano consecutivo, o governo federal envia as Forças Armadas para tentar controlar o desmatamento na Amazônia. Em meio ainda às mudanças tempestivas no Ministério do Meio Ambiente, é importante que o Estado se faça presente na região para tentar coibir uma nova alta no desmatamento, especialmente a criminalidade.
Nesse sentido, o Decreto 10.730/2021, que determina uma nova GLO, e o Decreto 10.735/2021, que estabelece uma moratória de fogo por 120 dias, são bem-vindos. Contudo, a estratégia já se mostrou insuficiente em 2019 e 2020, quando voltamos ao patamar de mais de 10 mil km2 destruídos por ano, em sua maioria em terras federais, e para onde rumamos em 2021.
A atual GLO e a moratória vêm com limitações que não asseguram que a lei e a ordem será respeitada agora. Em primeiro lugar, a presente GLO foca 26 municípios, enquanto o desmatamento ilegal é um processo sistêmico: quando anunciamos quais localidades serão objeto de operação, indicamos para os criminosos de onde eles devem sair e onde podem atuar com tranquilidade.
Em segundo, a nova GLO termina em agosto, mesmo sabendo que o desmatamento e as queimadas persistem em setembro e outubro, podendo chegar até a novembro. Para piorar, esse é um ano de influência de La Niña, que deixa especialmente o sul da Amazônia mais seco – o que amplia a janela de derrubada e de queimadas.
Em terceiro, a intermitência das ações na Amazônia, com um hiato entre cada GLO, estimula a criminalidade. Basta ver o que aconteceu em 2021: com o fim da Operação Verde Brasil 2 em abril, houve um pico de desmatamento e fogo em maio, e junho ruma na mesma direção.
Em quarto, há um descolamento entre as ações necessárias para acabar com o desmatamento e o discurso do governo federal, que na prática reduziu as operações do Ibama e do ICMBio no enfrentamento à criminalidade; protagonizou embates com lideranças indígenas, inclusive com ameaças de processo; e apoia projetos de lei em discussão no Congresso Nacional que estimulam o desmatamento, enfraquecem áreas protegidas e anistiam grilagem.
O presidente Jair Bolsonaro disse em abril, em evento sobre clima com líderes globais, que dobraria os recursos orçamentários para o combate ao desmatamento, mas ainda não houve um anúncio nesse sentido – a não ser a nova GLO, que é um esforço espasmódico e não permanente. O caminho para o fim do desmatamento pressupõe um conjunto de esforços coordenados, do governo federal e dos governos estaduais – que devem intensificar suas ações nas áreas que são de sua responsabilidade, como terras públicas estaduais e imóveis rurais; investimento em ações de inteligência; engajamento da sociedade civil e do setor privado; uma boa comunicação e transparência de dados; e uma legislação adequada para punir devidamente os criminosos.
Não podemos ter dicotomia de discursos, nem ações intermitentes. Precisamos encontrar um caminho definitivo para combater o desmatamento e a ilegalidade na Amazônia, e recolocar o país no grupo dos campeões climáticos.
Neste momento, as maiores economias do mundo rumam para reduzir suas pegadas de carbono como estratégia de desenvolvimento e recuperação pós-pandemia. Sem planos consistentes e de longo prazo, com investimento em produção livre de desmatamento, combate à ilegalidade, respeito às populações tradicionais e aos seus territórios, e salvaguardas socioambientais, o Brasil corre o risco de fincar sua imagem como pária, em vez de se colocar entre os grandes do século 21.