“Não temos mais tempo, precisamos de atitudes”, diz Mariazinha Baré na COP26

5 de novembro de 2021 | Notícias

nov 5, 2021 | Notícias

O espaço do Brazil Climate Action Hub na COP26 em Glasgow, na Escócia, recebeu nesta sexta-feira (5/11) o debate “Resiliência indígena: enfrentando incêndios na Amazônia brasileira“, organizado pelo IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), em parceria com a COICA (Coordinadora de las Organizaciones Indígenas de la Cuenca Amazónica), a COIAB (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira) e a APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil).

Participaram do evento a pesquisadora e ponto focal da agenda indígena no IPAM, Martha Fellows; o coordenador de Territórios e Recursos Naturais na COICA, Toya Manchineri; a coordenadora-geral na COIAB, Mariazinha Baré; e a diretora do Podáali, Valéria Paye. O Podáali é o Fundo Indígena da Amazônia Brasileira organizado pela COIAB, que na língua do povo Baniwa do tronco linguístico Aruak significa “doar sem querer receber nada em troca”.

Com foco no avanço de incêndios provocados por atividades externas ilegais nas terras indígenas da Amazônia brasileira, e nas estratégias aplicadas pelas organizações e pelos povos indígenas para enfrentar o cenário, os painelistas traçaram um panorama sobre o fogo na região nos últimos anos e compartilharam experiências sobre como a vida dessas comunidades vem sendo afetada pelos incêndios e pelos desmatamentos, práticas da grilagem e de invasões nos territórios.

“Não é só apagar fogo”

A iniciativa de brigadas indígenas foi citada como ponto comum de resistência de povos indígenas no trabalho de prevenção e combate ao “fogo ruim” – expressão pela qual organizações se referem a incêndios descontrolados provocados por agentes externos. “Fogo bom”, em contraponto à atividade ilegal, é aquele controlado, que remete ao uso tradicional e cultural do solo por povos indígenas, dentro de seus territórios.

Na Amazônia brasileira, segundo Mariazinha Baré, são 34 brigadas organizadas por povos indígenas. “Algumas têm apoio do governo, mas é por um período de seis meses, durante a estiagem, e depois paralisam as atividades. Isso tem sido uma preocupação nossa porque trazemos a proposta de atuar o ano todo no enfrentamento às queimadas ilegais na Amazônia, tendo como pano de fundo a prevenção, o reflorestamento, a capacitação e a educação ambiental. É um trabalho bem maior do que só apagar fogo”, completou.

“Lembramos aqui que os territórios indígenas são propriedades da União. Nós, povos indígenas, utilizamos, cuidamos e estamos tendo todo esse trabalho. Mesmo com essa situação, a gente enfrenta hoje o descaso geral com as terras indígenas. E, diante disso, povos e organizações vêm criando possibilidades de solução”, disse Valéria Paye. A diretora citou ainda o uso da tecnologia de aplicativos de celular para o monitoramento territorial. “Esses instrumentos somam e são resultados colhidos junto aos nossos parceiros. É por esse monitoramento que temos conseguido acompanhar o diagnóstico da situação de onde podem ocorrer queimadas, por exemplo.”

A homologação de terras indígenas e o fomento por meio de políticas públicas, lembrou Toya Manchineri, são medidas necessárias para a proteção da floresta. “O que sobra para nós muitas vezes é morte, das invasões de garimpeiro e da não efetivação de políticas públicas nos territórios indígenas. Eu penso que, como povos indígenas, para fazermos com que as florestas continuem em pé, é necessária uma ação muito básica: demarcar todos os territórios indígenas. Caso contrário, nós vamos ter o avanço do agronegócio e de outros empreendimentos que vão destruir a vida na floresta.”

Na contramão do mundo na pandemia, o Brasil aumentou as emissões de gases do efeito estufa. “Isso tem a ver com a mudança de uso da terra e com o desmatamento de terras indígenas. O cenário que temos hoje é muito maior que um Arco do Desmatamento, porque já está afetando outros estados”, disse Martha Fellows, destacando o papel dos povos indígenas para a conservação da natureza em sua relação única com os territórios. A região conhecida como Arco do Desmatamento compreende uma área de 500 mil km² entre os estados de Rondônia, Acre, Mato Grosso e Pará.

“A gente precisa de mudanças e de atitude concretas”, apontou Baré, em sua fala de encerramento no debate. “Estamos discutindo [o problema] há mais de trinta anos. Hoje, não estamos falando de mudança climática, estamos falando de crise climática. Se a gente tivesse cumprido o que falamos lá atrás, não estaríamos discutindo isso agora. A gente não tem mais tempo: ou mudamos de atitude, nós, a sociedade, o planeta; ou, então, eu sinto muito, não adianta vir para a COP e ficar falando a mesma coisa todo ano. Não vale a pena.”

Acesse a Carta da Amazônia, elaborada por povos indígenas, populações e comunidades tradicionais da Amazônia brasileira e enviada à COP26.

Acompanhe a agenda que o IPAM preparou para levar à Conferência.

E confira a programação do Brazil Climate Hub para participar virtualmente de eventos que ocorrem no espaço em Glasgow, na Escócia, até 12 de novembro.

 

 

 

 



Este projeto está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

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