Por Mariana Güths e Luiza Melo*
O Seminário Justiça Climática para Proteção dos Direitos e Soberania dos Povos Originários, organizado pelo IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) em parceria com o Ministério dos Povos Indígenas e apoio do EDF (Environmental Defense Fund), discutiu a participação dos povos originários no combate às mudanças climáticas.
Diversos representantes dos povos indígenas, de organizações da sociedade civil e dos Ministérios dos Povos Indígenas e do Meio Ambiente participaram do evento na última quinta (9) e sexta-feira (10). O intuito foi promover o diálogo entre esses setores sobre justiça climática como ferramenta de proteção e garantia dos direitos dos povos indígenas, além da soberania dessas populações frente à emergência climática.
A ministra Sônia Guajajara, do Ministério dos Povos Indígenas, esteve presente na mesa de abertura juntamente com Paulo Moutinho, pesquisador sênior do IPAM, Sineia do Vale, coordenadora do CIMIC (Comitê Indígena de Mudanças Climáticas) e Dinamam Tuxá, Coordenador da APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil). Eles dialogaram sobre o desmatamento, racismo ambiental e a importância das demarcações das Terras Indígenas. “Os indígenas são os que menos desmatam, mas os que mais sofrem as consequências”, afirmou a ministra. Já Moutinho ressaltou que para mitigar as mudanças climáticas, é preciso reconhecer os direitos dos povos indígenas.. “Quem ganha com isso somos todos nós”, disse ele.
A primeira mesa do Seminário teve a participação de Sineia do Vale e a presença virtual de Patrícia Pinho, diretora adjunta de Ciência do IPAM, e Vanda Witoto, profissional da saúde e candidata à Deputada Federal de Manaus. Elas abordaram os temas da vulnerabilidade climática, em que Patrícia apresentou dados do IPCC ( Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), que mostram mais de 3 milhões de pessoas na maior taxa de vulnerabilidade climática, que se concentram no hemisfério sul do globo, e 2 milhões com muito baixa vulnerabilidade, que estão localizados ao norte.
Sineia do Vale destacou a importância de medidas como o Fundo de Perdas e Danos, mas salientou que essa não é uma forma de mitigar as mudanças climáticas e que o processo deve ser mais rápido, porque as alterações já estão sendo sentidas até na temperatura da água. Vanda Witoto encerrou o debate da mesa apontando a importância da participação, do início ao fim, dos povos indígenas nas tomadas de decisões, além da falta de apoio político que as comunidades na Amazônia estão enfrentando. ”Nós não estamos enfrentando mudanças climáticas, mas emergência climática e precisamos pensar no que fazer”, concluiu Witoto.
A diretora de ciência do IPAM, Ane Alencar, esteve em uma das mesas discutindo o papel dos povos originários no combate à crise climática e injustiças territoriais junto com Francisco Baré, membro da FUNAI (Fundação Nacional dos Povos Indígenas). Os palestrantes reforçaram a importância das terras indígenas na preservação do clima.“A primeira coisa que precisamos entender é que estamos sob uma situação de emergência climática que está próxima do irreversível e as florestas têm um papel muito importante para a mitigação das mudanças climáticas. As terras indígenas são fundamentais para essa conservação”, ressaltou Alencar.
Além disso, os debates também permearam as perspectivas regionais e globais nas mudanças climáticas. Suliete Baré, do Ministério dos Povos Indígenas, ressaltou a importância do conhecimento dos povos indígenas sobre o tema. “O conhecimento dos povos indígenas também é ciência. A nossa forma de pensar a floresta também é importante para entender sobre as mudanças climáticas”, explicou.
Os debates da manhã de sexta-feira tiveram a participação de Ceiça Pitaguary, secretária de Gestão Ambiental e Territorial Indígena do Ministério de Povos Indígenas, Inamara Melo, Coordenadora geral de adaptação à Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Cláudia Franco, coordenadora-geral de Enfrentamento à Crise Climática do Ministério dos Povos Indígenas, Martha Fellows, pesquisadora de Ciência do IPAM, Steve Schwartzman, diretor sênior de políticas para florestas tropicais da EDF, Marcelo Piedrafita, especialista sênior em dados e política do Instituto Talanoa e Antônio Sanches, analista ambiental do Ministério do Meio Ambiente.
Os temas abordados foram o PNGATI (Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental em Terras Indígenas), Plano Nacional de Adaptação às Mudanças Climáticas, mecanismos para o combate às mudanças climáticas e o REDD+ (mecanismo para reduzir as emissões por desmatamento e degradação florestal), desde como surgiu a partir de um movimento social da Amazônia, o que significa, a sigla e suas salvaguardas, até a retomada da CONAREDD+, que tem como objetivo monitorar as estratégias de REDD+. “Além dos desafios para que todos saibam o que está acontecendo e a importância da presença das comunidades e povos originários para o enfrentamento das mudanças climáticas, devemos recompensar os esforços para as comunidades que há tanto tempo protege as florestas”, afirmou Sanches.
Com a presença de Túlio Andrade, do Ministério das Relações Exteriores, Sineia do Vale, e Alexandre Prado, da WWF (World Wildlife Fund), o último painel do seminário discutiu a justiça climática no âmbito internacional. “É muito importante que a gente leve essa voz [das comunidades tradicionais] para esses espaços. É necessário quando a gente vem do chão da aldeia e traz essas experiências para esses locais que também é nosso por direito”, destacou Sineia.
Ao final das mesas, um grupo de trabalho foi montado para pensar sobre as consequências que as mudanças climáticas causam para os participantes e pensar políticas públicas para o combate a esses impactos.
Para Martha Fellows, o seminário é uma oportunidade para somar a ciência indígena e a ciência não indígena com o intuito de pensar em soluções para o enfrentamento da crise climática. “Nas últimas semanas, vimos a seca extrema na Amazônia que afeta de maneira mais drástica as populações indígenas, extrativistas, ribeirinhas e quilombolas. E para mudarmos esse cenário, a gente precisa, realmente, pensar em ações estratégicas e imediatas. Por isso é tão importante estar aqui no Seminário e unindo forças com especialistas.” afirmou Fellows.
*Estagiárias sob supervisão de Sara Raíra Leal