Para debater como conciliar a produção agropecuária com a conservação da sociobiodiversidade, representantes do governo, da sociedade civil, universidades e setor privado se reuniram em Brasília para o Seminário Nacional do Cerrado nesta terça (05), organizado pelo IPAM e WWF. Bioma que tem passado por uma transformação no uso do solo, expansão da agricultura e avanço do desmatamento na última década, preservar o Cerrado não é uma questão de escolha, mas de sobrevivência, concordaram os participantes.
Para André Guimarães, diretor-executivo do IPAM, não é preciso escolher entre preservar ou produzir. “A dicotomia se ou se conserva ou se produz é uma dicotomia burra, não existe divergência entre produzir e conservar no Cerrado”, afirmou. Os debates do seminário giraram em torno de justamente desmitificar isso, equilibrando o desenvolvimento econômico, a conservação ambiental e o respeito às comunidades tradicionais e povos que vivem no Cerrado.
Com o objetivo de aumentar a transparência e reforçar os mecanismos de comando e controle, o ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, prometeu que os dados de desmatamento no Cerrado serão divulgados anualmente, como são os da Amazônia. “Mais que isso: estou lutando para que o desmatamento tanto na Amazônia quanto do Cerrado seja disponibilizado online em tempo real”, prometeu. O ministro lembrou que dezenas de milhares de hectares estão subutilizados em áreas já abertas, que podem e devem ser explorados sem criar novos impactos para o meio ambiente. “A sociedade precisa observar o Cerrado como um bem coletivo, importante para o controle de mudanças climáticas e preservação dos nossos recursos hídricos”, reforçou Sarney Filho. A floresta em pé vale mais que a floresta derrubada e é preciso demonstrar isso na prática.
Entre as medidas, o ministro defendeu a criação de uma Moratória da Soja no Cerrado e um Termo de Ajustamento de Conduta para a carne, como já existe na Amazônia. De fato, o mercado internacional tem deixado muito claro que haverá cada vez menos espaço para a pecuária sem base sustentável. “Essa é a única forma razoável de conduzir o desenvolvimento do país”, finalizou.
Maurício Voivodic, diretor-executivo do WWF Brasil, lembrou o quanto o Cerrado tem entrado na agenda de debate internacional. Esse momento é importante para se evitar o que aconteceu com a Mata Atlântica em décadas passadas, quando foi quase completamente destruída, já que hoje temos ferramentas muito mais precisas sobre como acontece esse desmatamento. “Hoje sabemos onde estamos desmatando, os atores, vetores e para quais cadeias produtivas. A informação está tão disponível que assistimos a conversão do Cerrado sabendo exatamente quais são as causas. E isso faz toda a diferença”, lembrou Voivodic.
As soluções precisam ser abrangentes e passam necessariamente pelo cumprimento do Código Florestal e a validação do Cadastro Ambiental Rural (CAR), na visão de Fábio Trigueirinho, presidente-executivo da Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais). “É preciso botar o CAR para funcionar porque a informação só passa a ser útil se a base de dados está correta”, cobrou.
Nenhuma ação pode ser feita, no entanto, sem considerar as comunidades tradicionais que vivem no Cerrado, pontuou Donald Sawyer, assessor sênior do ISPN (Instituto Sociedade, População e Natureza). “Para essas comunidades, o Cerrado é uma alternativa de vida decente, de não ter que migrar para as cidades onde não há emprego e renda suficiente. Como diz a campanha da CPT (Comissão Pastoral da Terra): sem Cerrado, sem água, sem vida”.
O seminário reuniu mais de 100 pessoas na capital federal e foi transmitido também para todo o país via o canal oficial do You Tube do IPAM. Na pauta, também foi discutido os principais mecanismos financeiros para promover o desmatamento zero, a influência da inteligência territorial nos riscos e oportunidades, a conservação de áreas por comunidades tradicionais e a infraestrutura pública e privada no Cerrado, entre outros assuntos. O mediador do evento foi o jornalista e editor do site Direto da Ciência, Maurício Tuffani.