Por Bibiana Alcântara Garrido*
Filipe Arruda é pesquisador do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) e atua em projetos de monitoramento da qualidade do ar do Instituto em parceria com o Centro de Pesquisa Climática Woodwell, dos Estados Unidos.
Em entrevista à Um Grau e Meio, Arruda destaca a integração e a ciência aberta como respostas para uma rede de monitoramento de qualidade do ar adequada à diversidade e à extensão geográfica brasileira.
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Entre os incêndios e a saúde
A necessidade de aprofundar os estudos sobre qualidade do ar segue níveis de poluição crescentes no planeta. Isso devido à queima de combustíveis fósseis, com consequências do fenômeno na saúde. Mas, no Brasil, o material particulado no ar aumenta, principalmente, por conta da fumaça de incêndios ambientais.
Em 2021, mais de 8 milhões de pessoas morreram no mundo por fatores ligados à poluição do ar. De fato, a má qualidade do ar naquele ano foi o segundo maior fator de risco global para a perda de vidas humanas. Ficou atrás apenas da pressão alta, no caso de adultos, e da desnutrição, em crianças.
Com o fim de contribuir, a partir da ciência, para reverter o cenário, o IPAM investiga as condições de qualidade do ar em pontos da Amazônia, do Cerrado e do Pantanal. São 50 sensores em diferentes contextos como cidades, unidades de conservação, terras indígenas e fazendas. Cada sensor coleta informações sobre poluição, pressão atmosférica, temperatura e umidade.
Sendo assim, os pesquisadores acumularam dados entre 2022 e 2023 e pretendem publicar um estudo ainda este ano. O material deve conter análises sobre a qualidade do ar mensurada em 20 sensores – selecionados por terem sido considerados mais robustos pelo grupo.
IPAM: Como está a qualidade do ar no Brasil?
Filipe Arruda: Hoje não é mais verdade que o ar está ruim só nas cidades. Nas unidades de conservação, terras indígenas, fazendas, onde se imaginava que havia uma qualidade do ar maior para respirar, também piorou.
Isso porque temos incêndios de grande extensão que impactam essas regiões. Por exemplo, na Amazônia, na maioria do ano, principalmente na estação seca, fica crítica a qualidade do ar, insalubre para grupos de risco ou para todas as pessoas, conforme o período.
No Cerrado e no Pantanal, biomas que também estão entre os mais queimados no Brasil, ainda há muitos desafios para o monitoramento.
Por que o monitoramento ainda lida com dificuldades e quais as saídas?
A primeira coisa é que não tinha uma legislação. A partir do momento em que ela foi criada, a gente precisa respeitar.
É só através da integração dos governos estaduais e federal, com suas verbas para instalação e manutenção de estações de referência de qualidade do ar, incentivando universidades, entre outros setores, é que a gente vai conseguir ter um monitoramento de qualidade do ar apropriado.
Em segundo lugar, acredito que redes como a Respira Amazônia, que é a primeira mais concreta que temos, deveriam estar sendo desenvolvidas em todo o país. A gente precisa de uma integração maior e que haja um engajamento das instituições, com uma liderança nacional, mas contemplando e conectando os contextos regionais.
O que a ciência tem a ver com as soluções para uma rede efetiva?
Se os dados que a gente obtém pelos sensores não são gratuitos, isso dificulta o acesso e o desenvolvimento de uma ciência de qualidade no Brasil. De tal forma que imagina o pesquisador do Acre ter que pagar para baixar informações, depois o de Mato Grosso também… não tem orçamento para pesquisa que aguente.
Por isso, estamos ampliando nosso trabalho e tentando criar uma plataforma aberta e gratuita com os dados em tempo real.
Qual é a contribuição do IPAM neste sentido?
A rede de sensores de qualidade do ar do IPAM é mantida em parceria com o Centro de Pesquisa Climática Woodwell, com a liderança das pesquisadoras Ane Alencar, diretora de Ciência do IPAM, e Marcia Macedo, cientista associada do Woodwell e IPAM.
Temos 50 sensores instalados em pontos da Amazônia e do Cerrado, também no Pantanal mato-grossense. Desse total, selecionamos 20, com dados mais robustos, para o lançamento de um estudo comparativo da qualidade do ar entre 2022 e 2023. O objetivo é publicar o material ainda este ano.
Com alguns dados preliminares, em suma, já é possível verificar a insalubridade do ar predominando em várias regiões. Pretendemos fortalecer as redes locais de monitoramento e subsidiar ações e políticas que compreendam conjuntamente as pautas ambiental e de saúde.
*Jornalista de ciência do IPAM, bibiana.garrido@ipam.org.br