O que é Cerrado: características e biodiversidade

7 de julho de 2023 | Notícias

jul 7, 2023 | Notícias

Por Lucas Guarlado*

O Cerrado é o segundo maior bioma brasileiro e cobre um quarto de todo o território nacional, sendo o lar de 837 espécies de aves, 161 espécies de mamíferos, sendo 19 delas são únicas do bioma, 150 espécies de anfíbios e 120 espécies de répteis. Recentemente, o Cerrado também se tornou um dos pontos centrais de desmatamento no Brasil e em todo o planeta.

Abaixo, explicamos um pouco mais sobre as características da sua cobertura vegetal, os aspectos culturais das populações que vivem no bioma e o quadro de desmatamento da região. 

Características do Cerrado

Devido à extensão de 2.036.448 km², o Cerrado tem diversas fitofisionomias. As formações savânicas, caracterizadas por árvores baixas e tortuosas e a grande quantidade de gramíneas, ocupam a maior parte do bioma. Formações campestres, com maior domínio de plantas rasteiras e pequenos arbustos, e florestais, mais densamente ocupadas com árvores maiores, também são comuns. 

O Cerrado também é apelidado de “caixa d’água do Brasil” por abrigar nascentes de rios como São Francisco, Tocantins e as bacias dos rios Paraná e Paraguai. Estão localizadas no bioma as nascentes de oito bacias hidrográficas entre as doze principais do país. A concentração de nascentes se deve, principalmente, à posição geográfica do bioma, no centro do Brasil, e sua altitude, que facilita o escoamento para outras regiões. 

Carbono no solo do Cerrado 

Uma característica do solo do Cerrado, que pode ter diversas composições morfológicas a depender do local onde foi coletado, é a concentração de carbono estocado. De acordo com a coleção beta da rede MapBiomas Solo, há 8,1 gigatoneladas de estoque de carbono orgânico do solo do bioma, em uma profundidade de 30 cm abaixo da superfície. Os pesquisadores coletaram e categorizaram amostras desde 1958 para mapear anualmente o carbono do solo entre 1985 e 2021. No Cerrado, as áreas de vegetação natural armazenam 4,3 gigatoneladas de carbono orgânico. Já nas áreas de agricultura, esse número aumenta para aproximadamente 49 gigatoneladas. 

Quando bem manejadas, as pastagens podem superar os estoques de carbono orgânico do solo que foram localizados nas áreas de vegetação nativa. Contudo, a preservação e proteção total de grandes áreas do bioma continuam sendo opções imprescindíveis para manter a biodiversidade da flora e da fauna da região. 

Desmatamento: bioma ameaçado

O desmatamento de vegetação nativa no Cerrado ocorre, principalmente, no Matopiba – região que engloba áreas dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia – uma das principais fronteiras agrícolas do Brasil. Em 2022, estados do Matopiba responderam por 77,7% de todo o desmatamento no bioma, cerca de 512 mil hectares. 

O desmatamento também tem prejudicado lagos e rios do Cerrado. Dentro de áreas protegidas, a cobertura de água diminui em 66% das regiões hidrográficas do bioma, sendo que 7 das 10 mais afetadas estão no Tocantins-Araguaia. 

Por conta de uma intensa exploração agropecuária, na forma de abertura de pasto e lavouras para produção de commodities agrícolas, estima-se que o bioma já tenha perdido mais da metade de sua cobertura original. Além disso, apesar de sua grande extensão e importância para a biodiversidade e o abastecimento de água brasileiro, apenas 1,7% do Cerrado está protegido por parques e áreas de conservação.

Áreas úmidas do Cerrado 

As áreas úmidas do Cerrado são um tipo de vegetação do bioma com predominância de camadas de gramíneas e arbustos, sujeitas ao alagamento sazonal. São encontradas, principalmente, na região da bacia do Tocantins-Araguaia e nas chapadas. 

Essas vegetações são fundamentais para o carregamento de reservatórios subterrâneos e rios que irrigam o país, além de oferecerem água em forma de lagoas temporárias e de espelhos d’água, responsáveis por abastecer a população local e a fauna do Cerrado. 

Áreas úmidas também são peças fundamentais para o “funcionamento” do bioma, que depende de seus ciclos de inundação e de seca. Por isso, alterações na drenagem de áreas úmidas podem acarretar na perda de biodiversidade, na degradação do ecossistema e na alteração do abastecimento de lençóis freáticos. 

Apesar de sua importância para todo o Brasil, as áreas úmidas do Cerrado vêm perdendo espaço, a cada ano, pela ação humana: entre 1985 e 2020, segundo dados do MapBiomas, o bioma teve 582 mil hectares de áreas úmidas destruídos– o que representa cerca de 10% do total de áreas úmidas que existia em 1985. A maior parte da perda, 61%, está relacionada à agropecuária.

A região hidrográfica do Tocantins-Araguaia foi a mais afetada: nos últimos 36 anos, perdeu 230.434 hectares de áreas úmidas, o equivalente a 40% de todas as perdas de áreas úmidas no Cerrado. Somente em 2021, a bacia do Rio Tocantins concentrou 23% de toda a área desmatada do bioma.

Cultura cerratense 

Os povos e comunidades tradicionais do Cerrado nos mostram exemplos de culturas que vivem em harmonia com a natureza ao seu redor. Habitantes da região há milhares de anos, as populações tradicionais do bioma conservam e vivem de forma harmoniosa com o bioma. 

O Cerrado abriga hoje pelo menos 216 terras indígenas de 83 diferentes etnias, distribuídas principalmente nos estados Maranhão, Tocantins, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Os povos originários da região, no entanto, sofrem com a lentidão no processo de demarcação de suas terras. 

Além disso, o Cerrado também é lar de quilombolas, geraizeiros, quebradeiras de coco babaçu, vazanteiros, comunidades de fundo e fecho de pasto, veredeiros, agricultores familiares, ciganos e muita gente preserva um estilo de vida sustentável e harmonioso com o bioma. 

Mas apesar da contribuição histórica para a proteção do ecossistema, as populações tradicionais do Cerrado também não têm garantia de proteção.  Desmatamento, incêndios, grilagem e atividades como o uso de agrotóxicos  no bioma têm levado violência e instabilidade para as comunidades. Grileiros expulsam famílias das terras que habitam há séculos e recursos naturais, como água e alimentos, vão se tornando cada vez mais raros. 

De acordo com dados do aplicativo Tô no Mapa, que viabiliza  o automapeamento de povos, comunidades tradicionais e agricultores familiares no Brasil, 40% de todos os conflitos vivenciados pelas mais de 24 mil famílias cadastradas estão relacionados à falta de direitos territoriais. Conflitos pela terra e invasões, como os causados pela grilagem verde – prática de sobreposição em áreas ocupadas por populações tradicionais, representam 28% e 12% de todas as ameaças registradas na ferramenta. Na sequência, com 17%  estão as disputas por acesso à água.

Jornalista no IPAM, lucas.itaborahy@ipam.org.br*



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