O decreto 10.424, de 15 de julho de 2020, publicado no Diário Oficial da União, proíbe o uso de fogo na Amazônia e no Pantanal nos próximos 120 dias. Tal como aconteceu no ano passado, ele visa a reduzir o impacto do fogo nesses dois biomas durante a estação mais seca nessas vegetações.
Em 2019, após o fogo atingir índices bastante elevados na Amazônia em comparação com anos anteriores, e sua fumaça chegar a outras regiões, o governo federal publicou um decreto semelhante, em agosto. Concomitante a ações de comando e controle, o movimento ajudou a controlar os focos de calor nos meses seguintes, revertendo a tendência de crescimento esperada para os meses de setembro e outubro.
Em 2020, o governo federal editou o decreto antes de a situação piorar, e esperamos que o resultado seja positivo. Isso é especialmente importante quando lembramos que mais fumaça no ar significa mais problemas respiratórios para a população nessas regiões, que podem se sobrepor à crise de saúde pública já existente devido à pandemia de covid-19.
Contudo, para que no futuro (esperamos que próximo) decretos do tipo não sejam mais necessários e o fogo seja parte do passado, é necessário colocar esforços e recursos também em questões estruturantes.
Primeiro, é preciso investir em tecnologias que substituam o fogo como prática agropecuária. Se ele ainda hoje é usado no Brasil para controlar pragas, renovar pastagens e como incremento nutricional imediato ao solo é porque técnicas mais modernas e sustentáveis não chegaram aos produtores. Popularizar essas tecnologias permitem resultado mais eficiente no controle de pragas e manejo de pastagens, e mantém o solo saudável por mais tempo.
Segundo, fortalecer os governos estaduais para fiscalizarem o uso correto do fogo em seus territórios, e para monitorarem as licenças concedidas, permite acompanhar as atividades legalmente realizadas e evita que as autorizações sejam usadas erroneamente para queimar (ou desmatar) outras áreas.
Terceiro, é preciso acabar com o desmatamento. Quando um terreno é limpo, ou seja, suas árvores são derrubadas para dar espaço a outro uso, o fogo extingue resquícios da vegetação desmatada e seca, e as cinzas são usadas para alimentar esse solo, que no caso da Amazônia é pobre em nutrientes, para dar espaço às pastagens. Como a própria ministra da Agricultura, Tereza Cristina, disse recentemente, e como mostram diversos estudos científicos, o Brasil tem terras abertas mais do que suficientes para atingir todas as metas de crescimento do setor agropecuário até meados do século.
Por fim, lembramos que a floresta amazônica, ao contrário das florestas da Austrália e da Califórnia, não pega fogo naturalmente, e nem evoluiu para isso. Com o agravamento das mudanças climáticas, a vegetação fica mais suscetível a qualquer fagulha virar incêndio florestal – além da queima ainda produzir mais gases do efeito estufa, que por sua vez levam a mais mudanças climáticas, num ciclo perverso. O fogo, seja para limpeza de terreno pós-desmatamento ou como ferramenta agrícola, deve ser progressivamente abandonado e substituído por métodos mais alinhados com os desafios do século 21.
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