Para se tornar oportunidade de transição econômica, o estabelecimento do mercado regulado de carbono no Brasil, o SBCE (Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões), necessita de gestão e governança, com MRV [Mensuração/Monitoramento, Relato e Verificação] robusto e transparente. A afirmação é de Gabriela Savian, diretora adjunta de Políticas Públicas do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), que participa da COP29 em Baku, no Azerbaijão.
As regras e metodologias para a regularização do comércio de créditos de carbono no Brasil foram aprovadas pelo Congresso Nacional e agora aguardam sanção presidencial. O Projeto de Lei 182/2024 estabelece limites de emissões para diversos setores da economia e regula entidades que emitem mais de 10 mil toneladas de CO2.
“O próprio reconhecimento do mercado de carbono e alguns limites, critérios e premissas para que o mercado de carbono como um todo, seja ele regulado ou voluntário, é de suma importância. É relevante que um projeto de lei tenha assumido o estabelecimento dos créditos jurisdicionais e que ele crie salvaguardas para os territórios tradicionais. Essa criação é fundamental tanto para reduzir as emissões, quanto para gerar mecanismos financeiros para a proteção das florestas”, destaca Gabriela Savian.
O projeto irá adequar o Brasil aos parâmetros internacionais estabelecidos para a redução de gases de efeito estufa. O mercado brasileiro será dividido entre o regulado, que inclui entidades de grande porte que deverão operar de acordo com as metas de descarbonização definidas pelo SBCE, e o voluntário, sem metas e valores definidos.
Territórios tradicionais e agronegócio
Projeto tramitou na Câmara e no Senado e sofreu uma série de mudanças. Dentre as principais alterações estão a destinação de fundos do SBCE para povos e comunidades tradicionais. Agora, 70% dos valores de contratos focados na manutenção de florestas e recuperação de áreas desmatadas deverão ser destinados a indígenas e quilombolas.
A nova versão do projeto também permite que produtores rurais possam emitir créditos com respaldo de APPs (Áreas de Preservação Permanente), áreas de reserva legal e de uso restrito, cuja preservação já está demandada no Código Florestal. A produção agropecuária em si, no entanto, não será incluída na lista de setores submetidos ao SBCE.
“Colocar o agro no mercado de carbono regulado seria uma grande vantagem para o próprio agro porque preserva sua capacidade produtiva futura. Temos uma agricultura que é o carro-chefe da economia e que depende da chuva para irrigação. Essa chuva é estabilizada justamente pelas florestas, então quando o agronegócio se coloca fora da discussão desse mercado regular, a gente perde uma oportunidade enquanto país e eles enquanto setor”, defendeu.
Mercado mundial
No primeiro dia da COP 29, realizada em Baku, capital do Azerbaijão, os países participantes aprovaram um conjunto de padrões de qualidade que irão guiar o mercado internacional de carbono, apoiado pela ONU. As novas regras regulam a forma como são calculados os créditos e as emissões de carbono e regulam a “qualidade” do carbono capturado – esclarecendo como países devem contabilizar com áreas degradadas ou queimadas no mercado, por exemplo. O novo padrão busca facilitar o cumprimento de metas climáticas mediante a comercialização de créditos.
Segundo estimativas da Associação Internacional de Comércio de Emissões, que apoiou a estruturação dos padrões de qualidade, o comércio total do mercado mundial de carbono poderia gerar em torno de R$ 1,4 trilhão em títulos, além de reduzir em 5 bilhões as emissões de dióxido de carbono. No Brasil, oitavo maior emissor de CO2 do planeta, estima-se que a criação de mercados de carbono regulado e voluntário é capaz de gerar até R$ 689 milhões, segundo estudo da Câmara de Comércio Internacional.