Jefferson Simões: um cientista brasileiro no Polo Sul

4 de setembro de 2023 | Notícias

set 4, 2023 | Notícias

Por Lucas Guaraldo*

É seguro dizer que Jefferson Simões não entrou no curso de ciências ambientais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul com pretensões de se tornar um glaciologista – nome dado aos pesquisadores do gelo. No entanto, a preocupação com as mudanças no clima já chamava a atenção do futuro pesquisador, mesmo que o assunto percorresse o Brasil timidamente durante os anos 70.

“Quando eu estava no ensino médio, a questão das mudanças ambientais já eram debatidas, mas com um foco muito claro no Rio Grande do Sul. Eu vi que ia se criando um problema que precisaria de alguém que entendesse os sistemas climáticos do planeta. Quando me formei, em 1983, o programa antártico brasileiro havia sido criado recentemente, então apresentei uma proposta de doutorado para Cambridge e fui aceito na área.”

Quando chegou à europa para continuar seus estudos, Jefferson era um dos primeiros brasileiros a pesquisar a criosfera – nome utilizado para se referir a todo o gelo e neve existentes na superfície terrestre. A familiaridade do pesquisador com o tema, no entanto, veio rápido e, ao longo de sua carreira, foram 22 expedições à Antártida.

Em 2004, Jefferson percorreu mais de 2,3 mil quilômetros para se tornar o primeiro pesquisador brasileiro a chegar em uma expedição científica no Polo Sul por via terrestre. A missão serviu para a instalação de módulos de monitoramento climático, que acompanham as mudanças no polo sul do planeta e servem como um primeiro alarme para os fenômenos que afetam o planeta.

Atualmente, o pesquisador trabalha como professor de Geografia Polar e Glaciologia na UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), um dos líderes científicos no Programa Antártico Brasileiro e professor colaborador do CCI (Climate Change Institute), na Universidade do Maine, nos EUA.

Neve amazônica

Embora os polos do planeta concentrem a imensa maioria do gelo do planeta, engana-se quem pensa que eles ocupam todo o tempo de estudo de Jefferson. Em 2018, o pesquisador liderou uma expedição aos andes do Peru para coletar amostras de gelo e assim entendermos melhor dois pontos chave para o clima na América do Sul: o passado climático da Amazônia pré-colombiana e a relação da maior floresta tropical do mundo com a maior cadeia de montanhas da região.

“A gente sabe muito bem que a Antártida e a Amazônia tem uma relação próxima, mas ainda sabemos muito pouco sobre esse tema. A relação da Amazônia com a neve no Andes também é pouquíssimo estudada e isso preocupa porque é uma região que vem derretendo muito rapidamente. Isso tem consequências diretas pro rio Amazonas, que tem algumas de suas nascentes na cordilheira, quanto para o abastecimento da população andina, que depende da água que vem da Amazônia pelo ar e forma a neve que abastece as cidades durante o ano.”

A viagem, no entanto, foi prejudicada pelas mudanças no clima da região. As geleiras que antes cobriam vales inteiros, haviam se transformado em lagos andinos e neve fofa, por úteis para a pesquisa de Jefferson. O trabalho da expedição, que reunia pesquisadores de vários países, acabou frustrada pela elevação de temperatura nas montanhas.

“A gente vê muito claramente as mudanças climáticas na Amazônia e na região dos Andes. Comparando com como as coisas eram quando comecei a pesquisar, a diferença é assustadora. É justamente por isso que a coleta de testemunhos de gelo é tão importante. Só assim conseguimos medir o real impacto das atividades humanas no clima mundial e testar os modelos que temos para planejar o futuro.”

Testemunhos são longos cilindros de gelo coletados em diversas profundidades. Dependendo da região onde ocorre a retirada, essas amostras podem trazer dados sobre as condições de clima, carbono no ar, temperatura e precipitação de séculos passados. Na Amazônia, pesquisadores poderiam mapear, com precisão, várias as mudanças no clima da região bem antes da chegada dos colonizadores.

Jornalista no IPAM, lucas.itaborahy@ipam.org.br*



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