“Ferramentas e inteligência podem destravar o financiamento na COP30”

28 de julho de 2025 | Notícias, Um Grau e Meio

jul 28, 2025 | Notícias, Um Grau e Meio

Marcello Brito é secretário executivo do Consórcio da Amazônia Legal, enviado especial para os governos subnacionais amazônicos da COP30 e conselheiro do IPAM. Em entrevista à Um Grau e Meio, ele fala nas principais questões e desafios da Conferência do Clima em novembro em Belém (PA). 

 Em Bonn, houve avanço nas negociações, mas a discussão esbarra no financiamento. Isso pode contaminar o resultado da COP30? 

Acho que essa discussão não vai nem acontecer, não tem espaço geopolítico para se discutir financiamento internacional. No mundo polarizado como está hoje, não cabe.  

A gente precisa entender quais são as ferramentas inteligentes que podemos criar para o financiamento climático. Veja que há 20 anos não existia nenhuma ferramenta de financiamento privado para a estrutura agrícola no mundo. Era tudo via governo, subsídios, planos safras e assim por diante.  

 Um país como o Brasil, que está entre os três maiores do mundo do agro, tem hoje 70% da agricultura feita através de ferramentas privadas, como FIAGRO [Fundo de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais], CRAS [Certificados de Recebíveis do Agronegócio] e assim por diante.  

Precisamos ter a inteligência de criar esses modelos de financiamento para ter dinheiro suficiente para fazer a transição. Não será com doação que a gente vai resolver isso, não tem como construir essa agenda para a COP30. 

 A quais resultados a gente precisa e deve chegar na COP30? 

 Os resultados são todos de longo prazo e a gente não vai aferir nenhum. Nós estamos falando de coisas que são de impacto planetário ou de impactos amazônicos. As medições serão por décadas.  

Eu acho que a gente tem que procurar sair daqui, pelo menos, com acordo comum, em coisas muito específicas que fazem diferença no nosso dia a dia, relacionados à agricultura, à energia, à mineração e como a gente pode acelerar a questão da transição dos fósseis, que ainda é só uma utopia, nada está acontecendo de verdade. 

 Como construir o debate para que haja um consenso entre o discurso de necessidade de afastamento dos fósseis e uma estratégia interna que envolve, inclusive, o governo, Petrobras, petrolíferas? 

 Essa é uma discussão tremenda, porque sair dos fósseis também implica na estrutura fiscal do governo, na segurança fiscal que mantém o país. Hoje, a maior parte dos impostos recolhidos no Brasil, e não só no Brasil, mas na maioria dos países do mundo, advém da economia tradicional, da economia antiga. Então, não é uma transição fácil.  

 Dá uma olhada na Costa Rica, que vem fazendo esse processo já desde 1987, e agora tem um problema fiscal porque eles reduziram tanto a utilização de fósseis que está dando problema na economia no país, justamente pela falta dos impostos provocados por esse setor. Não é uma equação fácil. É uma equação que vai depender de muita inteligência e de muito mais jovens aderindo a essa ação de forma efetiva. 

A discussão sobre a hospedagem, que foi inclusive tema em Bonn, em reuniões internas e reclamações formais de alguns países, pode contaminar a COP de alguma forma? 

Pode. Isso é uma realidade: 27% dos leitos disponíveis de Belém são hotéis. O restante é Airbnb, apartamentos etc. Você não coloca delegações internacionais em Airbnb, coloca todos juntos em hotéis. Então a gente está acostumado a ver: um hotel é só China, outro é só Alemanha, outro é só Estados Unidos. Não vai ter isso em Belém.  

 Quem sabe essas dificuldades impostas com a realidade local de uma cidade como Belém, no Brasil, mostrem um caminho diferente para as COPs?  

 Que a Conferência deixe de ser showcases do setor privado e passe a ser realmente negociação séria entre os países. E que esteja ali quem realmente está fazendo uma negociação de transformação e não para quem está querendo fazer um show de apresentação. Aí a gente reduz o número de pessoas, mas coloca efetivamente quem tem o que propõe, o que tem que fazer para transformar. 

 Como o Brasil pode conduzir a virada de chave como presidência da COP?  

Começa pelo modelo que está sendo implementado pela presidência da COP do Brasil: uma COP aberta, muito inclusiva. Você vê a decisão de criar um grupo de enviados para que o maior número possível de setores seja representado, ouvido e que isso faça parte dos planos de ação.  

 



Este projeto está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

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