Os dois primeiros dias da COP 27, domingo e a segunda-feira, respectivamente, 6 e 7 de novembro, combinaram momentos de “aquecimento” – com participantes ainda em fase de credenciamento e estandes sendo finalizados – a outros já de grande importância, como o lançamento do relatório provisório sobre o clima global em 2022 da Organização Meteorológica Mundial (OMM). O estudo indica que os últimos oito anos podem ser os mais quentes já registrados.
Em seu discurso na abertura do painel intergovernamental, o secretário-geral da ONU (Organização das Nações Unidas), António Guterres, pediu um pacto de solidariedade climática entre os países desenvolvidos e as economias emergentes, com liderança dos Estados Unidos e da China, e a tributação dos lucros inesperados das empresas de combustíveis fósseis. “Coopere ou pereça”, alertou, acrescentando que “o fracasso em lidar com o clima é um pacto de suicídio coletivo”.
Na outra ponta, eventos paralelos foram destaques em pavilhões temáticos espalhados pela conferência. Reunindo pesquisadores, acadêmicos, setor privado e povos originários, o IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) inaugurou sua participação à frente de dois painéis.
Diretoras de Ciência do instituto destacaram, diante do cenário de alerta máximo, novas ações e incentivos para garantir a segurança alimentar em um futuro que exigirá adaptações, bem como o papel dos povos do Cerrado para a manutenção das vegetações e de um clima global estável e a importância de reconhecer a existência dessas comunidades.
No pavilhão da WWF (World Wide Fund for Nature), a diretora de Ciência do IPAM, Ane Alencar, apontou que há milhares de comunidades invisíveis no Cerrado, enfrentando conflitos por terra e água decorrentes da expansão do agronegócio. Atualmente, mais de cinco mil famílias de povos e comunidades tradicionais e de pequenos agricultores utilizaram o aplicativo Tô no Mapa para realizar o automapeamento de seus territórios. São grupos ainda não reconhecidos nos dados oficiais brasileiros.
“O primeiro passo é reconhecê-las, identificá-las e incluí-las no mapa”, ressaltou Alencar. “Se conseguirmos organizar o uso da terra e a ocupação do bioma, o Brasil continuará aumentando sua produção de alimentos ao mesmo tempo em que irá proteger os seus sistemas culturais e de água, existentes no coração do país.”.
O Cerrado é um dos biomas mais biodiverso do mundo e já perdeu quase a metade de sua vegetação. Em agosto e setembro deste ano, o desmatamento no bioma mais que dobrou, em comparação com o mesmo período de 2021. De acordo com dados do SAD Cerrado (Sistema de Alerta de Desmatamento do Cerrado), foram 144 mil hectares derrubados, uma alta de 135% sobre os 65 mil hectares do ano anterior. O aumento da atividade ocorreu principalmente em áreas sem informação fundiária, o que chama a atenção de pesquisadores. Essas áreas concentram 45% do total derrubado nos dois meses, contra 12% no ano anterior. Imóveis rurais privados têm 48% de toda a área desmatada no bioma no período, sendo que no ano passado eram 77%.
Incentivo à preservação
Em pavilhão próximo, a diretora-adjunta de Ciência do IPAM, Patrícia Pinho, participou do painel “Fazendas e inovadores no centro: soluções para criar sistemas alimentares resilientes para o futuro”, onde destacou o projeto CONSERV, iniciativa desenvolvida pelo instituto, em parceria com o Woodwell Clmate Research Center e com o EDF (Environmental Defense Fund).
“Os serviços ecossistêmicos que a floresta provê são crucias para a produção de commodities. Com o CONSERV, nós identificamos e analisamos o montante de vegetação que continua em pé dentro de propriedades privadas e incentivamos financeiramente para que o produtor não derrube as árvores dessas áreas”, afirmou Pinho.
Participam atualmente do projeto cerca de 20 grandes propriedades, onde os produtores não só são incentivados a protegerem a floresta, mas também a aumentarem a produção em áreas menores, “gerando mais benefícios ecossistêmicos, incluindo polinização, recursos hídricos e regulação do clima”, complementou.
Estudo recente publicado na revista científica Nature Food, em um trabalho de cooperação internacional, mapeou os dez principais produtos agrícolas do mundo e sua destinação. A descoberta acende um sinal de alerta para a desnutrição em vários países, mostrando que plantações com uso direto de alimento são insuficientes para cumprir com o segundo ODS (Objetivo de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas). A meta diz respeito à segurança alimentar para todas as pessoas até 2030.