“Companhias de petróleo focam em lucro, sem medir as consequências”

1 de dezembro de 2025 | Notícias

dez 1, 2025 | Notícias

Um dos maiores especialistas em ciência do clima do país, Paulo Artaxo, presidente do Conselho Deliberativo do IPAM, aponta avanços na agenda da COP30, mas enfatiza ser crucial o debate urgente sobre os combustíveis fósseis. O cientista falou à Newsletter Um Grau e Meio:

– Qual o principal legado da COP30?

Foram vários. Primeiro deles, o Brasil, na COP30, mostrou um vigor da sociedade civil que não existe em nenhuma outra COP até o momento. Demonstrou que os movimentos sociais no Brasil estão extremamente ativos, engajados na questão de encontrar soluções para a questão das mudanças climáticas globais. Por outro lado, outros legados foram principalmente a questão de que os países produtores de petróleo não vão abrir mão da questão de continuar emitindo o máximo possível de gás de efeito estufa para a atmosfera, agravando o efeito estufa global. O que nós observamos é que as companhias de petróleo estão focadas em ter o maior lucro possível no menor espaço de tempo possível, não importa as consequências para os 7,7 bilhões de seres humanos em nosso planeta.

– Qual sua avaliação sobre os textos finais?

Os textos finais da COP endereçam algumas questões essenciais, como adaptação, financiamento e dos combustíveis fósseis. Adaptação e financiamento foram declarações muito genéricas e não compromissos concretos. Os países se comprometeram a aumentar, a triplicar o financiamento dos países ricos para os países pobres realizarem a transição energética e se adaptarem ao novo clima, sem colocar valores, sem colocar mecanismos, sem colocar absolutamente nada, só uma citação genérica. Na questão do GGA (Global Adaptation Strategy ou da estratégia de adaptação climática global), foi importante constar no documento final da COP que os países têm que fazer um esforço para se adaptar ao novo clima e diminuir os impactos negativos das mudanças climáticas em suas populações, no sistema socioeconômico e assim por diante. E o grande desfalque foi a falta de qualquer menção à questão dos combustíveis fósseis. Quer dizer, você elimina do documento final o aspecto principal das mudanças climáticas, que é a queima de combustíveis fósseis, por causa do lobby da indústria do petróleo.

– Na sua avaliação, quais foram os destaques positivos e negativos?

O principal destaque positivo desta COP foi o trabalho conjunto dos países recuperando basicamente o multilateralismo. Observamos 195 países presentes na COP, o que é significativo. O ponto negativo é certamente o fato de que o lobby da indústria do petróleo está vencendo todas as tentativas de efetivamente termos um clima estável no futuro para o nosso planeta como um todo. Então, isto é um problema muito sério, na verdade, e a gente vai ter que tratar essa questão nas próximas COPs.

– Você pode falar sobre a expectativa da COP paralela sobre combustíveis fósseis que vai ocorrer na Colômbia em abril?

Um dos pontos positivos dessa COP foi também o apoio de 80 países à proposta brasileira de construir um roadmap sobre o fim dos combustíveis fósseis, como acabar com a exploração e uso de combustíveis fósseis em todo o nosso planeta. Nesse sentido, a Colômbia propôs organizar uma reunião em abril do ano que vem especificamente para tratar desta questão crítica, e que certamente é o tópico mais importante de todas as COPs. Então, essa pré-COP, digamos assim, vai ser muito importante, porque vai basicamente concretizar uma proposta para um caminho, um roadmap para a extinção do uso de combustíveis fósseis em nosso planeta de uma maneira justa e mais rápida possível.

– O Brasil exerceu a liderança no debate climático. Como este protagonismo pode continuar sendo exercido?

A organização da COP e a coordenação dos trabalhos foram feitas de maneira muito competente pelo presidente da COP, pela CEO da COP. Esse protagonismo deve continuar ao longo desse ano inteiro, já que o presidente da COP vai continuar coordenando os trabalhos até a próxima COP na Turquia. Portanto, eu acho que é importante a gente auxiliar o André Correia do Lago, o presidente da COP, em desenhar estratégias, primeiro, que sejam aceitáveis para os demais países, ou seja, uma questão da negociação diplomática, sobre os três aspectos importantes das COPs: financiamento, adaptação e fim dos combustíveis fósseis. Então, nesse sentido, o Brasil tem apoio da Colômbia, da Inglaterra, da Alemanha e assim por diante, de parceiros importantes e vamos trabalhar em conjunto para que nós chegamos na próxima, podemos chegar na próxima COP com boas perspectivas de aprovação de alguma rota de caminho para o fim dos combustíveis fósseis, que é a coisa mais importante que nós temos que fazer hoje em relação a mudanças climáticas globais.

– Qual deve ser o papel da sociedade civil brasileira para alcançar resultados concretos e mais rápidos?

A sociedade civil brasileira teve um papel muito importante nessa COP, colocando claramente propostas de soluções em todas as áreas, praticamente, da sociedade sendo afetada pelas mudanças climáticas globais. Então, é muito interessante e é uma novidade para os demais países, já que a participação da sociedade civil na COP do Brasil foi muito mais importante do que nas demais COP. Nós temos que efetivamente reforçar o papel da sociedade civil para ter um protagonismo importante na questão climática como um todo.

– Já é possível olhar para as prioridades da COP da Turquia? Quais devem ser?

As prioridades para a próxima COP na Turquia certamente deve ser, primeiro, construir e negociar um mapa do caminho para o fim dos combustíveis fósseis o mais rápido possível, intensificando a transição energética para energias renováveis. A questão da adaptação vai continuar sendo uma prioridade para a COP da Turquia, já que está longe de ter resolvido essa questão, bem como a questão do financiamento climático, que também deixou muito a desejar na COP do Brasil. Portanto, nós temos tarefas importantes para resolver na COP30 e temos um ano, praticamente, para a gente se preparar e dar fundamentos para o presidente da COP, André Correia do Lago, para que ele se prepare adequadamente nas negociações e nos documentos que deverão subsidiar as decisões da COP31 na Turquia.

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