Somente três das terras indígenas (TIs) da Amazônia Legal com mais queimadas em 2020, em relação à proporção do tamanho territorial de cada, têm brigadas indígenas contratadas para a temporada de fogo de 2021. Esse é um dos resultados de uma análise feita pela COIAB (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira) em parceria técnica com o IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia).
Além da ausência das políticas de proteção ambiental para diversas TIs observada nos últimos anos, a quantidade de brigadistas indígenas contratados é muito aquém do necessário. Em média, cada brigadista indígena contratado tem uma área de 224 quilômetros quadrados de atuação, o equivalente a, aproximadamente, 1.245 campos de futebol do Maracanã.
A falta de apoio é inversamente proporcional à necessidade de proteção desses territórios. As TIs guardam grandes estoques florestais, que ficam vulneráveis aos incêndios florestais na época da seca.
“Os resultados desta análise são alarmantes, dada a dimensão dos impactos que os incêndios causam ao meio ambiente e aos povos indígenas. O território é o meio mais importante de sua manifestação física e cultural e os povos indígenas isolados dependem integralmente dele. Políticas de proteção aos povos e às terras indígenas são constitucionais e devem ser garantidas”, explica Ananda Santa Rosa de Andrade, consultora técnica da COIAB e uma das autoras do trabalho.
Outro ponto preocupante é o risco de fogo acima da média em 2021. Ele pode estar associado à anomalia negativa de chuvas na região desde o começo do ano, como detalhou o estudo da ISciences Global Water Monitor & Forecast Watch List. As TIs que apresentam mais risco, em grande parte, têm registro de povos indígenas isolados e apresentaram taxas altas de desmatamento, conforme último balanço do PRODES – nenhuma contemplada pelo Programa Brigadas Federais esse ano.
Deficiências
Nos últimos dois anos, as taxas de fogo na Amazônia brasileira aumentaram, conforme dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). O sucateamento do Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) é reflexo da desvalorização das políticas públicas ambientais sobre fogo nas terras indígenas e, por consequência, nestes resultados.
“Existe um ciclo vicioso de atividades ilegais que atinge as terras indígenas, como invasão, desmatamento e mineração. Isso tudo, mais o clima, aumenta muito o risco de fogo nessas áreas, atingindo diretamente os povos indígenas”, afirma a pesquisadora do IPAM Martha Fellows e uma das autoras do estudo. “Ainda assim, por enquanto, somente 654 brigadistas indígenas foram contratados em 2021. A baixa resposta do governo federal para enfrentar a situação crítica vivida por esses povos coloca em risco sua sobrevivência.”
A responsabilidade sobre a prevenção e o combate aos incêndios florestais nas TIs é do poder público. Por isso, cabe ao Estado a criação e capacitação de brigadas indígenas, principalmente das identificadas com alto risco de fogo; retomar o fortalecimento de comando e controle dos órgãos ambientais; realizar campanhas de prevenção; e criar mecanismos de fomento para práticas de impacto positivo.
Por meio do Programa Brigadas Federais, o Ibama contrata e forma brigadistas para atuar no Cerrado, Caatinga, Pantanal e Amazônia. Apesar de o programa apresentar um caráter inovador por contemplar os povos indígenas na formação e contratação como brigadistas, a política ainda tem severas deficiências e atuação tímida, dada a dimensão das queimadas ilegais nas TIs da Amazônia.
“Para haver ações responsivas, atividades preventivas são fatores primordiais, seguidas de atividades de combate aos incêndios por equipes especializadas, que são as brigadas florestais”, diz Andrade.
Leia o estudo completo aqui.