Por Suellen Nunes*
Amaral Rosa, é historiador e comunicador, e reflete sobre o papel simbólico de Belém às vésperas da COP30. Com a COP30 batendo na porta, Belém se prepara para receber olhares do mundo. Para o historiador, a cidade já carrega respostas sobre sustentabilidade.
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Nesta entrevista à newsletter do IPAM, ele comenta história, cultura e o papel simbólico da capital amazônica.
Belém vai sediar a COP30 em alguns dias. Na sua visão, o que torna a cidade um símbolo importante para discutir sustentabilidade em escala global?
Belém é, por natureza, um ponto de encontro entre o urbano e o florestal. Aqui, o cotidiano das pessoas ainda é profundamente marcado pelos rios, pelas feiras, pelos produtos da floresta e por um modo de vida que reconhece a dependência da natureza. É uma cidade que nasceu amazônica e continua sendo, mesmo com os desafios da modernidade. A COP30, ao acontecer aqui, simboliza o reencontro do mundo com o essencial: entender que a sustentabilidade não é uma ideia abstrata, mas algo que se vive no dia a dia.
A realização da COP30 em Belém coloca a Amazônia no centro das discussões globais sobre o clima e o desenvolvimento sustentável. Qual o significado simbólico e estratégico dessa escolha para o Brasil e para o mundo?
Belém não é apenas uma cidade-sede conveniente, mas estrategicamente necessária para o futuro do debate climático.
A COP30 aqui é um convite para o mundo olhar a Amazônia urbana e entender que ela é parte fundamental da equação climática. A cidade reúne, em seu território, as tensões e as possibilidades de um planeta que precisa conciliar desenvolvimento, justiça social e conservação ambiental.
De que forma a história e a cultura da cidade se conectam com as práticas de convivência com o ambiente?
A história de Belém mostra que a floresta nunca foi um obstáculo, e sim parte da própria identidade. A culinária, a música, as festas populares e até a arquitetura da cidade são respostas criativas ao ambiente. Veja o açaí, o peixe, o tucupi — são alimentos que vêm diretamente da relação com os rios e a floresta. Tudo isso mostra uma sabedoria antiga, que vem sendo transmitida e reinventada até hoje.
A presença de povos indígenas, ribeirinhos e quilombolas foi fundamental para a formação de Belém. Como reconhecer e valorizar esses saberes no contexto urbano?
Esses povos são a base da nossa história. Quando falamos de sustentabilidade, precisamos ouvir quem vive há séculos em harmonia com o ambiente. A cidade precisa enxergar esses saberes não como algo do passado, mas como conhecimento vivo, essencial para planejar o futuro. O que chamamos hoje de economia da floresta, por exemplo, já existe há muito tempo nesses modos de vida.
Belém tem uma trajetória histórica singular dentro da Amazônia. Que aspectos é possível destacar desse contexto?
De certa forma, Belém volta ao mapa mundial. A cidade que um dia serviu de marco na divisão do mundo entre Portugal e Espanha se tornou ponto de partida para a ocupação da Amazônia e, durante o ciclo da borracha, um centro de circulação de ideias e riqueza.
Talvez, a COP30, com seus desafios e oportunidades, seja o impulso necessário para alinhar a infraestrutura de Belém à sua relevância histórica e geopolítica.
Quando o mundo voltar seus olhos para Belém durante a COP30, que cidade acreditas que deve ser revelada? Quais histórias, saberes e expressões culturais precisam ser vistos e reconhecidos além dos debates oficiais do evento?
É essencial mostrar uma Belém menos óbvia, valorizando sua história e os saberes tradicionais que atravessam gerações. O artesanato paraense, das jóias de sementes à cerâmica marajoara, é expressão viva da cultura e da relação ancestral com o território, revelando a riqueza e a identidade da Amazônia.Enxergar Belém é compreender que a Amazônia não se resume à floresta intocada, mas também às cidades que pulsam dentro dela, lugares onde cultura, memória e natureza se entrelaçam, revelando caminhos possíveis para um futuro mais equilibrado.
Se pudesse resumir Belém em uma palavra, qual seria?
“Encontro”. Porque é o encontro das águas, das culturas, das histórias e dos tempos. E é desse encontro que nasce a força que pode inspirar o mundo.
Analista de comunicação do IPAM*

