Por Elias Serejo*
Com o objetivo de levantar as contribuições da agricultura familiar para o Programa de Integridade e Desenvolvimento da Pecuária Paraense, evento realizado em Belém no mês de maio reuniu trabalhadores rurais de cerca de 50 municípios dos 144 que existem no estado. A partir do diálogo, uma proposta será sistematizada contendo demandas específicas do setor e entregue ao governo.
O evento foi organizado pelo IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) em parceria com a SEAF-PA (Secretaria de Agricultura Familiar do Estado do Pará), a FETRAF-PA (Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar do Pará) e a FETAGRI-PA (Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado do Pará).
O evento mobilizou aproximadamente 70 lideranças de cooperativas, sindicatos e associações de trabalhadores que desenvolvem a atividade da agricultura familiar. “Este é um espaço para ampliar o conhecimento sobre o programa, discutir criticamente o documento e ajustar ações à realidade da agricultura familiar para uma implementação eficaz ao final deste processo”, destacou Edivan Carvalho, coordenador do Ipam no Pará.
Durante o seminário, Cassio Alves Pereira, titular da SEAF destacou a importância da produção familiar para o desenvolvimento da pecuária.: “Os agricultures familiares são atores sociais inestimáveis para a implementação de políticas públicas eficazes no estado, sobretudo na pecuária, já que representam parcela significativa do setor” afirmou. Pereira ressaltou que a criação da secretaria em 2023 e a inserção da pasta no debate, fortalecem as demandas “Esperamos alavancar políticas mais robustas e integradas”.
O seminário compõe um processo amplo de incidência junto ao estado no fortalecimento de práticas sustentáveis na agricultura familiar. “O encontro é fundamental pois nos permite ouvir diretamente dos atores envolvidos na cadeia. Entre os destaques do debate estiveram as dúvidas sobre a rastreabilidade, a necessidade de suporte abrangente, incluindo assistência técnica e qualificação, que são fundamentais para o desenvolvimento sustentável”, explicou Carvalho.
Para o secretário da SEAF, um dos desafios do programa para o agricultor familiar é a rastreabilidade: “É um sistema sofisticado que demandará esforço significativo e investimento dos produtores. Por isso, precisa ser cuidadosamente planejado. Nosso objetivo é que os agricultores possam internalizar e adaptar o conceito do programa, considerando tanto os benefícios quanto os custos envolvidos”, disse.
Agricultura familiar e pecuária
Adailson Ferreira da Silva é um nome que ressoa com a simplicidade e a determinação do homem do campo. Morador de Maracanã, cidade da Região de Integração Guamá, ele é um agricultor familiar e criador de gado que abraça tanto a tradição quanto a inovação na gestão de sua propriedade.
Criado em uma família consciente da importância da sustentabilidade, Adailson aprendeu desde cedo que o uso responsável da terra é fundamental não apenas para a subsistência imediata, mas para garantir o futuro das próximas gerações. Ele administra um lote de 25 hectares, onde dedica 10 hectares à criação de gado de corte, integrando harmoniosamente a atividade pecuária com o cultivo de bacurizeiros, uma árvore frutífera local.
De acordo com o agricultor, a discussão sobre a regularização fundiária e ambiental toca diretamente os desafios que enfrenta em sua propriedade. “A implementação de um sistema de rastreabilidade é uma solução inovadora que vai agregar valor ao produto, mas ainda preciso entender melhor como vai funcionar”, afirmou.
Em seu imóvel rural, o manejo do gado e a limpeza dos pastos são feitos manualmente, respeitando a área de preservação de nascentes existente no terreno. Esse cuidado é reflexo da visão de Adailson e de sua família sobre a importância de conservar o ambiente ao redor, não apenas para a agricultura e pecuária, mas como um compromisso ético com o planeta.
“Se degradar a terra, sofre a gente, o gado e o clima. Acaba tudo, inclusive o investimento que fizemos,” reflete Adailson, consciente das interconexões entre as práticas agrícolas sustentáveis e redução dos impactos ambientais e sociais a longo prazo.
O seminário do qual participou Adailson integra uma estratégia mais abrangente que visa implementar o Decreto 3.533, de 27 de novembro de 2023, que criou o Programa de Integridade e Desenvolvimento da Cadeia Produtiva da Pecuária de Bovídeos Paraenses, cujo objetivo é tornar a pecuária uma atividade mais sustentável e produtiva, aumentando a renda dos produtores enquanto atende às crescentes exigências dos mercados consumidores e aos desafios impostos pela crise climática e ambiental.
A sistematização das informações levantadas durante o evento será apresentada na próxima reunião do Conselho Gestor do Programa. O fórum, composto por representantes do governo e da sociedade civil, está encarregado de implementar o programa. O compromisso foi estabelecido pelo titular da SEAF.
O programa
Lançado em 2023, o Programa de Integridade e Desenvolvimento da Cadeia Produtiva da Pecuária de Bovídeos Paraenses é uma ambiciosa iniciativa de monitoramento ambiental e sanitário no combate ao desmatamento e na promoção de práticas sustentáveis na cadeia produtiva da pecuária. “O programa é uma parceria entre diferentes atores sociais e busca não apenas a melhoria da qualidade dos produtos bovinos paraenses, mas também garante a conformidade com as regulamentações sanitárias, fundiárias e socioambientais”, afirmou Raul Protázio Romão, secretário adjunto da SEMAS-PA (Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade).
Integrado a outras políticas estaduais e federais, o programa foca na baixa emissão de gases de efeito estufa e alinha-se com os esforços globais de sustentabilidade e clima. A iniciativa também promete valorizar os produtos locais através da rastreabilidade, assegurando que os consumidores possam identificar a origem dos produtos que compram.
Dentre as metas estão a rastreabilidade individual de 100% do trânsito de bovinos até dezembro de 2025 e de todo o rebanho até o final de 2026. Adicionalmente, o programa visa validar 75% dos Cadastros Ambientais Rurais até dezembro de 2025, com a meta de alcançar 100% no ano seguinte. Outro objetivo é a recuperação de 20% das pastagens degradadas e a inclusão de 100% dos produtores em programas de regularização comercial em caso de não conformidades.
*Jornalista do IPAM.