Por Sara Leal*
O último relatório de financiamento para a biodiversidade da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) mostra que o aporte foi duplicado entre 2015 e 2022, atingindo aproximadamente 15,4 bilhões de dólares. Apesar do aumento, o valor representa 15% da meta acordada de 200 bilhões de dólares por ano até 2030.
O estudo foi apresentado durante a plenária Mobilizando Bilhões: Caminhos para Alcançar o Quadro Global da Biodiversidade, do 7º Simpósio de Casos de Investimento GLF, que ocorre na COP16 da Biodiversidade em Cali (Colômbia) até 1º de novembro.
Criado na COP15, realizada em Montreal no Canadá, a meta do Fundo do Quadro Global para a Biodiversidade prevê que os países se comprometam a arrecadar, juntos, 200 bilhões de dólares por ano até 2030 para ações voltadas à biodiversidade, 20 bilhões só dos países do Norte Global até 2025, que seriam voltados aos países do Sul.
“O financiamento é um elemento crucial e catalizador para a conservação da biodiversidade”, afirmou Ane Alencar, diretora de Ciência do IPAM, durante participação no evento. “Estamos falando de uma das riquezas mais importantes do mundo. A Amazônia, por exemplo, é um dos lugares com maior biodiversidade do planeta: a cada dois dias encontra-se uma espécie nova”.
A responsabilidade dos governos
Para alcançar a meta, é preciso que os governos deem o exemplo, afirmou Kumi Kitamori, diretora-adjunta de Meio Ambiente da OCDE. “Isso significa estabelecer metas ambiciosas na área de políticas de biodiversidade e alinhar seus orçamentos nacionais, orçamento público e financiamento para apoiar essas metas”, disse. Segundo ela, menos de 2% dos orçamentos públicos nacionais são gastos e alocados para atividades de biodiversidade entre diferentes governos.
Os governos podem, ainda, ajudar a mobilizar o financiamento privado. “Não só reduzindo o risco do investimento privado, mas também definindo e enviando sinais políticos claros, porque é assim que os atores privados tomam decisões”, explicou Kitamori.
Além disso, os governos podem usar incentivos positivos à biodiversidade, como impostos e pagamentos por serviços ecossistêmicos e compensações de biodiversidade para definir o tom e impedir atividades prejudiciais por parte de atores privados.
“Alguns desses incentivos, como impostos, também geram receitas para os governos, que poderão usar o recurso em atividades para apoiar as metas de biodiversidade”, disse a representante da OCDE.
O monitoramento de instrumentos econômicos e financeiros para a biodiversidade feito pela OCDE mostra que impostos relacionados à biodiversidade geram cerca de 11 bilhões de dólares, anualmente, nos países monitorados. “Parece muito, mas ainda é uma fração muito pequena – apenas 1,3% do que chamamos de receitas tributarias relacionadas ao meio ambiente, que os governos em todo o mundo arrecadam como receita pública”, explicou a diretora-adjunta.
Valorização e reconhecimento dos povos indígenas
Kleber Karipuna, líder Indígena do Povo Karipuna e coordenador executivo da APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), ressaltou o trabalho dos povos indígenas na conservação da biodiversidade e como, apesar disso, o financiamento não chega nas aldeias.
“O tema desta COP é paz com a natureza. Nós, povos indígenas, já vivemos em paz com a natureza”, afirmou Karipuna. “Há financiamento para grandes empresas que impactam diretamente a perda da biodiversidade. Se os povos indígenas são reconhecidos como 5% da população e protegem mais de 80% da biodiversidade do planeta, a conta está desproporcional. Se quisermos mesmo viver em paz com natureza, é preciso repensar essa dinâmica. Confiem e apoiem os povos indígenas”.
Segundo o integrante do povo Karipuna, é preciso que o financiamento direto chegue aos povos originários, que os mecanismos de fundo indígena que já existem sejam potencializados e que os investimentos sejam de longo prazo para fortalecer cada vez mais as estratégias de conservação que eles já possuem.
IPAM como novo membro do GLF
Durante a plenária, foi anunciada a entrada do IPAM no GLF (Global Landscapes Forum), tornando-se seu 35º membro junto a organizações como a FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), o PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente), o WRI (World Resources Institute), entre outros.
“Há mais de dez anos, o GLF traz discussão do uso da terra, da importância de trabalhar a paisagem do ponto de vista de uma agricultura e de um uso da floresta mais sustentáveis, a importância de ter finanças que possam promover o uso sustentável dessas áreas e a proteção e conservação desses locais. Portanto, é uma agenda muito alinhada à do IPAM”, afirmou Ane Alencar.
*Coordenadora de Comunicação do IPAM, sara.pereira@ipam.org.br