“Falaram que poderíamos ter nosso sítio aqui e viemos. A escolha era a luta pela terra.”

22 de julho de 2024 | Um Grau e Meio

jul 22, 2024 | Um Grau e Meio

Por Lucas Guaraldo*

Marinalva Tavares de Sousa é direta quando explica seus motivos para ter se mudado para o Assentamento Antônio Conselheiro com sua família anos atrás: veio por conta da luta de terras.

“A gente chegou aqui na região por causa da luta pela terra. A gente foi aonde a gente conseguiu a  conquista da terra. Falaram que poderíamos ter nosso sítio aqui e viemos. Não tínhamos escolha. A escolha era a luta pela terra.”

Fruto, principalmente, do êxodo rural da região Sul do Brasil e batizado em homenagem ao líder de Canudos, o assentamento também tem sua importância histórica. Nasceu na reforma agrária, no início dos anos 90, já como o maior assentamento rural da América Latina, abrangendo mais de 37 mil hectares entre os Município de Barra do Bugres e Tangará da Serra, no Mato Grosso. A terra antes ocupada pela fazenda Tapirapuã, está no coração da produção agrícola no oeste mato-grossense.

Alocados em lotes em lotes de 25 hectares, Marinalva e outras 990 famílias passam então a trabalhar para que o enorme latifúndio abandonado se transforme em um centro de produção e uma ilha da agricultura familiar no Estado. A proximidade da agropecuária de grande escala não iludiu Marinalva que acreditou na diversificação da produção como forma de garantir seu sustento, se tornando uma referência para aqueles à sua volta. 

“Temos que diversificar a produção para a gente se manter porque senão a gente não consegue. A monocultura é para os fazendeiros, que eles têm espaço grande, pode criar muito gado, pode plantar muita soja, plantar muita cana. Agora, para a agricultura familiar, quem tem um espaço de propriedade pequeno, tem que diversificar a produção”, destaca.

Luta pela água

Mesmo com a produção estabelecida e as terras regularizadas, o assentamento Antônio Conselheiro e suas famílias sofrem com a falta de água. A perturbação dos cursos naturais da água, ampliada pelo desmatamento de matas ciliares e as chuvas cada vez mais inconstantes que abalam todo o Estado, tem afetado os mais pobres primeiro e com mais força.

“A gente tem discutido muito sobre a questão dessa seca. A gente sabe que foi um retorno do que nós fizemos no passado. Agora temos essa questão desse período que não está chovendo na nossa de Mato Grosso, uma região que chove muito nesse período. Nos anos 80, já estaria chovendo muito. Nesse período você já estava plantando”, relembra Marinalva.

Desde 1985, o Estado do Mato Grosso perdeu 31% de toda a sua área de vegetação nativa para a criação de pastagens e lavouras. A diminuição nas áreas de mata tem tido efeitos severos no equilíbrio da região, que vem sofrendo com secas cada vez mais severas, chuvas imprevisíveis e queimadas de grande proporção. Para enfrentar a crise no clima, Marinalva, mais uma vez, busca as soluções que fazem sentido para os pequenos produtores: cooperação e uma visão de que as áreas preservadas de seu sítio também tem o potencial de serem as mais lucrativas. 

“Se a seca é devido à devastação da natureza, então a gente tem que reflorestar e proteger o que ainda resta porque eu tenho certeza que no futuro nós vamos precisar muito de nossas minas. Já estamos precisando. Eu tenho comentado com meus companheiros de assentamento que no futuro nós vamos ganhar pela proteção da mata e por termos nosso sítio reflorestado.”

Jornalista do IPAM, lucas.itaborahy@ipam.org.br*

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