Por Lucas Guaraldo*
O Programa Pró-Rios, do governo do Pará, abriu edital para que instituições financeiras colaborem com a preservação dos rios do estado. O projeto pretende arrecadar cerca de R$ 350 milhões e juros serão definidos com base no desempenho de indicadores de sustentabilidade estabelecidos pelo IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia).
A iniciativa pretende implementar a Política Estadual de Conservação de Rios, com a adoção de um marco legal para conservação e um detalhamento dos procedimentos necessários para proteção. O Pró-Rios também irá implementar um modelo piloto de preservação para a bacia dos rios São Benedito e Azul, localizados na transição entre a Amazônia e o Cerrado.
“Hoje os rios servem como uma fronteira para as áreas de preservação e isso impede que o seu curso seja preservado de fato. Conter o desmatamento na Amazônia é extremamente importante, mas não é tudo. É preciso proteger as águas da região, colocando os rios no centro da preservação”, ressalta Ana Cristina Barros, coordenadora do projeto na Posaidon Capital, ONG suíça que coordena projetos de conservação no mercado financeiro.
Além do levantamento dos indicativos do desempenho da preservação do estado, pesquisadoras do IPAM vão colaborar com a análise da situação geral dos rios do Pará e propor caminhos para uma política eficaz de preservação dos rios paraenses.
A iniciativa, também conta com o apoio da Fundação Gordon e Betty Moore, com assistência técnica da NINT (Natural Intelligence) e Poseidon Capital. As atividades serão executadas pela Semas (Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará) e diversos órgãos e entidades da gestão estadual.
Por que os rios?
Atualmente, mais de 34 milhões de pessoas dependem de peixes com fonte primária de alimentação e renda nos países da floresta amazônica e o consumo por pessoa pode chegar a 550g por dia. Além disso, a atividade pesqueira emprega mais de 200 mil pessoas na região, produzindo mais de 400 mil toneladas de pescado. Estima-se que o potencial de pesca na bacia Amazônica possa atingir 1 milhão de toneladas por ano, cerca de metade da produção de pescados de água doce do Brasil.
Na Amazônia, os rios também agem como estradas, conectando alguns dos principais centros urbanos e comerciais da região e servindo como rota de escoamento. As linhas regulares hidroviárias estaduais e interestaduais transportam, por ano, pelo menos 10 milhões de passageiros e mais de 6 milhões de toneladas de carga pelos rios da Amazônia. O estado do Pará concentra a maior parte (58%) das embarcações que oferecem transporte de passageiros e também o trecho com maior estimativa de carga anual, a rota Santarém-Manaus.
Ainda, entre 2000 e 2023, o consumo de água mais que dobrou nos estados da Amazônia Legal. Atualmente, 31% da água captada é destinada ao abastecimento urbano e rural, enquanto mais da metade (53%) é utilizada pelo agronegócio. No Pará, estima-se que a atividade agropecuária está consumindo, em média, mais de 14,2 mil litros de água por segundo da natureza, em 2023.
Além de sua importância na alimentação e transporte, os rios extensos e caudalosos da Amazônia são fundamentais na irrigação e no abastecimento hídrico brasileiro, por meio das chuvas e da captação de água ao longo de seus cursos. Estima-se que cerca de 25% das chuvas no sul e sudeste brasileiros estejam diretamente relacionadas à umidade lançada na atmosfera pelos rios e árvores amazônicas.
Os cursos d’água também são vitais para a cultura e a biodiversidade amazônica. Os povos e comunidades tradicionais da região, assim como os complexos ecossistemas que os cercam, são possíveis graças aos recursos naturais que surgem a partir dos rios. Os grandes mosaicos hídricos, pontilhados por igarapés, meandros e lagoas, foram fundamentais na construção do sistema homem-natureza da cultura amazônida.
Jornalista no IPAM, lucas.itaborahy@ipam.org.br*