Por Bibiana Alcântara Garrido*
O IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) apoiou a criação da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Transição Climática Justa, com subsídios técnicos e visão estratégica para o enfrentamento ao contexto de emergência climática. De caráter participativo e suprapartidário, a Frente será lançada em evento presencial no Salão Nobre da Câmara dos Deputados nesta terça-feira (18), às 16h30, hora de Brasília.
“A sociedade brasileira tomou a decisão e optou por um plano de governo que contempla de forma transversal a transição climática e a descarbonização da economia. Uma visão que se conecta com o que há de mais inovador em termos de desenvolvimento econômico no mundo e com os compromissos do Brasil no âmbito dos acordos globais de clima. Essa transição requererá uma atuação de Estado, assim, o executivo, o legislativo e o judiciário terão que integrar suas visões estratégicas para o bem comum da sociedade brasileira. Nesse sentido, essa frente parlamentar mista representa uma oportunidade de debate estruturado com os diferentes segmentos da sociedade, no âmbito do legislativo, para a construção de um processo justo de transição climática”, avalia Eugênio Pantoja, diretor de Políticas Públicas e Desenvolvimento Territorial no IPAM.
A proposta de criação da FPM é da deputada Socorro Neri (PP/AC) e angariou assinaturas da Câmara dos Deputados e Senado Federal. O principal objetivo da Frente é assegurar as respostas do país à Mitigação e Adaptação à mudança climática global durante o processo de transição para uma economia de baixo carbono. As ações devem ser direcionadas à conservação ambiental e à proteção das populações mais vulneráveis aos impactos das alterações provocadas pela mudança do clima, como pessoas pobres, negras, moradoras de áreas de risco, além de povos e comunidades tradicionais. A Frente tem duração indeterminada.
“Justiça climática é um tema muito relevante, pois reconhece as comunidades mais vulneráveis e impactadas pelas mudanças do clima, e as desigualdades intrínsecas dessa condição. Nesse contexto, a Ciência é fundamental para medir impactos e sugerir soluções para reduzi-los”, acrescenta Ane Alencar, diretora de Ciência no IPAM e coordenadora do MapBiomas Fogo.
Entre as ações que a iniciativa pretende entregar à sociedade estão debates e contribuições relevantes ao Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima, da Estratégia Nacional para REDD+, e do Mercado Brasileiro de Redução de Emissões; bem como a proposição de instrumentos econômicos e financeiros para apoiar a transição climática; além de considerações sobre planos setoriais. A criação de observatórios e espaços de interlocução com a sociedade será uma estratégia na defesa dos direitos e proteção de todas as comunidades afetadas pelas mudanças climáticas.
Desmatamento, grilagem e emissões
O Brasil já foi reconhecido como liderança internacional por ter alcançado uma queda histórica de 83% no desmatamento da Amazônia, a partir da implementação do PPCDAm (Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal) entre 2004 e 2012, programa retomado este ano pelo governo federal. O cancelamento de registros irregulares de CAR (Cadastro Ambiental Rural) e a designação de uso para terras públicas ainda não destinadas estão entre as medidas imediatas mais efetivas para o controle e a redução do desmatamento, motor das emissões brasileiras.
Entre 2018 e 2021, 51% das áreas desmatadas na Amazônia eram terras públicas. Registros ilegais de CAR, que se sobrepõem a áreas de unidades de conservação ou a terras indígenas, têm sido usados como mecanismo para o desmate em locais que deveriam ser protegidos. A terra indígena Ituna/Itatá, no Pará, por exemplo, está 94% sobreposta com CAR, o que indica invasão e grilagem. Somente nos três primeiros anos de governo Bolsonaro, foram 57 milhões de toneladas de gás carbônico emitidas por desmatamento dentro de terras indígenas, quase 60% das emissões do tipo desde 2013.
Agropecuária, desmatamento e fogo associado a essa atividade respondem por 73,8% das emissões anuais do Brasil, conforme dados do SEEG (Sistema de Estimativa de Emissões e Remoções de Gases do Efeito Estufa). O país está entre os maiores emissores do mundo, na 4° posição se consideradas as emissões acumuladas entre 1850 e 2021. Além do combate ao desmatamento, a adoção de boas práticas na agropecuária reduziria em ao menos 49% o desmate de vegetação nativa.
Compromisso global
O comprometimento e atuação em metas climáticas mais ambiciosas são vistos pela comunidade científica como fundamentais para cumprir o Acordo de Paris, firmado em 2015 por 196 países, e limitar o aumento da temperatura média do planeta em 1,5°C em relação aos níveis pré-industriais. Reduzir as emissões por ação humana, que agravam o superaquecimento da Terra, é o caminho para alcançar esse objetivo comum, por meio da conservação e proteção de territórios, do investimento em práticas agropecuárias de baixo carbono e da transição energética.
Eventos climáticos extremos na história recente refletem o superaquecimento que está em 1,1°C. De acordo com relatório das Nações Unidas, com a falta de progresso e a implementação somente das metas atuais, o planeta está a caminho de uma elevação de até 2,8°C na temperatura média. Como cada décimo de acréscimo nessa temperatura conta mudanças intensas a nível local, um aumento de 2°C já teria como consequência global até 14 vezes mais ondas de calor e 70% mais secas, segundo o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas).
*Jornalista no IPAM, bibiana.garrido@ipam.org.br