Brasília (2/12/2015) – Um grupo de pesquisadores do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) publicou nesta quarta-feira um estudo que mostra que o mercado consumidor de soja pode ter um papel decisivo não só na redução do desmatamento na região amazônica, mas também influindo positivamente no cumprimento do Código Florestal.
Para que isso aconteça, os compradores da commodity brasileira precisam incluir em seus critérios de aquisição a exigência de que o agricultor esteja em dia com a lei florestal em vigor no país. Para os pesquisadores, o Código Florestal tem instrumentos capazes de incentivar o setor a varrer o desmatamento ilegal de suas cadeias produtivas.
Para chegar a esta conclusão, os estudiosos escolheram o estado do Mato Grosso, maior produtor e exportador da soja brasileira. Das 3.291 propriedades produtoras do grão no bioma Amazônico analisadas na pesquisa, a maioria (82%) cumpre os critérios da Moratória da Soja – um acordo voluntário entre setor produtivo, governo e sociedade civil para evitar a comercialização de grãos plantados em áreas desmatadas da Amazônia após julho de 2008.
O que causou admiração foi constatar que dois terços das propriedades estudadas, ou seja, 1.738 unidades, têm passivo de reserva legal, apesar de não terem desmatado após julho de 2008. Em outras palavras, estão quites com a moratória da soja, mas em total desacordo com o Código Florestal.
“É possível que essa mesma lógica se aplique a outros estados da Amazônia Legal. E não só em relação à soja, mas também à pecuária, cujos impactos sobre a floresta também são acompanhados por iniciativas como os Termos de Ajuste de Conduta que envolvem produtores, comerciantes, Ministério Público e ONGs”, acredita Andrea Azevedo, líder do estudo.
Muito além da moratória
A pesquisadora do IPAM lembra que, no plano internacional, as grandes redes compradoras da soja brasileira estão cada vez mais alinhadas com cadeias produtivas livres do desmatamento, a exemplo dos signatários da Declaração de Nova York sobre Florestas – documento que prevê reduzir pela metade o desmatamento até 2020 e zerá-lo até 2030. Entre os que assinaram a declaração estão gigantes, como a Cargill e outras empresas de grande porte, que compram dos produtores brasileiros.
Muitos desses compradores também fazem parte de organizações como o The Consumer Goods Forum (TCGF), que reúne indústrias, comerciantes, bancos e provedores de serviços ligados ao mercado de commodities em 70 países. Todos atentos ao risco da imagem que pode vir da aquisição de produtos provenientes do desmatamento.
“Nossa expectativa é que o mercado comece a exigir critérios de cumprimento da lei florestal do Brasil, indo além do que prevê a moratória da soja. O mesmo deve se aplicar ao setor que financia a produção agrícola”, afirma Marcelo Stabile, um dos autores do estudo.
Para ele, o Código Florestal já traz mecanismos que podem ajudar o mercado a monitorar se os fornecedores de grãos – ou carne – cumprem a lei. É o caso do Cadastro Ambiental Rural (CAR), capaz de quantificar o que cada propriedade desmatou, além do permitido.
A cobrança pelo cumprimento do Código Florestal, por exemplo, já faz parte dos critérios para liberação de crédito agrícola. Desde 2014, uma norma do Banco Central beneficia produtores rurais inscritos no CAR. Quem está na rota da legalidade pode aumentar em 15% o crédito para custeio da produção, com juros mais baixos que os do mercado.
Mas o fato é que os incentivos ao cumprimento com o Código Florestal são poucos, e o mercado deve ser um parceiro nessa empreitada.
“Ao cobrar que os produtores cumpram a lei, os compradores de commodities brasileiras irão reforçar o Código Florestal e seus principais instrumentos, apoiando as políticas do governo”, diz Tiago Reis, coautor da pesquisa, referindo-se ao CAR e aos Programas de Regularização Ambiental (PRAs).
A ideia é que mecanismos como a moratória da soja não só sejam reforçados, mas também ampliem o âmbito de suas exigências, apoiando a legislação ambiental.
No mercado interno, a atenção volta-se para as grandes redes de supermercados instaladas no país, que já estão sendo pressionadas a informar ao consumidor do varejo a origem dos produtos agropecuários – sobretudo da carne – proveniente da Amazônia.
“Uma vez cumprido como deve ser, o Código Florestal pode evitar a emissão de grandes quantidades de gases de efeito estufa, ao limitar o desmatamento, e ainda ajudar o país a remover da atmosfera quantidades enormes de carbono, no processo de restauração das florestas derrubadas ilegalmente, como prevê a lei. Isto é uma enorme contribuição para as metas do Brasil na Convenção do Clima das Nações Unidas”, lembrou Reis.